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No próximo sábado, dia 12 de Março, haverá uma manifestação nas ruas de Lisboa (e outra nas ruas do Porto). Prevê-se que essa manifestação (que no meu dicionário vem definida como “expressão pública e colectiva de um sentimento ou de uma opinião”, e que apesar da perfeita adequação à situação às vezes é preterida em favor de outras como demonstração ou marcha em favor de ou algo similar, por razões que seria interessante analisar melhor) contará com a presença de várias dezenas de milhares de pessoas. E num universo tão vasto, as razões para adesão serão certamente múltiplas. Mas uma das razões que será certamente comum a muitas dessas pessoas é o vínculo precário de trabalho que possuem. A justificação desse vínculo precário, por quem tem o poder de fazer as coisas de outro modo, é muitas vezes a falta de experiência dos trabalhadores (outra palavra que apesar de se adequar perfeitamente à situação é preterida em favor de outras como colaborador e afins).
Alega-se: que os jovens precisam de formação; que a entidade empregadora (para não dizer o patrão) necessita de experimentar o jovem, isto é, precisa de um “período de experimentação”; que os jovens não têm experiência na função; que porque os jovens mudaram de função ao fim de alguns anos regressaram (à casa da partida sem receber dois contos) à situação de falta de experiência e necessidade de formação; que a entidade empregadora está a prestar um serviço à comunidade (ao país e ao mundo) ao permitir a formação dos jovens; que está a prestar um serviço ao jovem porque lhe permite a aquisição dessa experiência e a melhoria do seu currículo; etc.
O discurso tem mil e uma variantes mas, em relação a este caso concreto, vai sempre dar ao mesmo: a necessidade de formação do jovem justifica que ele não seja remunerado justamente pelo trabalho que desempenha ou não seja remunerado de todo, que essa situação se perpetue ano após ano durante períodos que em alguns casos já vão próximo dos quinze anos, que apesar disso os contratos sejam sempre por períodos muito curtos, que no final do período de formação (que nunca se sabe quando é) não haja perspectivas de evolução para uma situação mais estável e com melhores condições, etc.
A verdade é que a necessidade de uns e a ingenuidade de outros (que às vezes se misturam) contribui para que a realidade seja assim, e a passividade e incapacidade de muitos para avançar com alternativas, que tanto podem resultar de uma adesão pouco esclarecida a uma forma dominante de pensamento, ou de uma simples constatação da sua falta de poder para alterar as coisas, contribuem para que essa realidade se perpetue.
Ora o que se tem passado com muitas pessoas nessa situação, trabalhando em empresas ou organismos públicos, é precisamente o mesmo que se tem passado ao nível da investigação (fundamental ou aplicada) e desenvolvimento científicos em Portugal, e mais especificamente ao nível do LNEC.
Assim, apesar de a aprendizagem (mais do que formação, que contém em si o significado de formatação) ser algo que só deixa de acontecer quando um espírito está decrépito, apesar dessa aprendizagem permanente ser sempre necessária ao desempenho profissional, e apesar de todos sabermos disso, os argumentos de que um bolseiro ou um estagiário não possui experiência profissional e de que necessita de formação são utilizados todos os dias no LNEC para justificarem as suas situações profissionais desfavorecidas relativamente aos restantes trabalhadores.
O argumento da formação não deve ser ultrapassado com o argumento da não necessidade de formação ou da posse de experiência profissional suficiente. Esses argumentos podem e serão sempre facilmente desmentidos, bastando para isso colocar a pessoa numa situação com a qual nunca antes se tinha confrontado e para a qual não é capaz de dar uma resposta imediata. Qualquer pessoa sucumbiria a tal teste.
O argumento da formação, pura e simplesmente não é um argumento. É apenas e só uma falácia.
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