sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Variações en passant...




Passam vários pavões
com palavrões nos pês...

Passa uma palavra.

Passeia.

Passageiro,
passo pelas palavras,
pelas palavras
que passam.

Até as mais pesadas
pensadas
prensadas
palavras
passam!

Passo por elas,
piso pegadas,
faço papéis...

Papo pastéis!

Passa outra palavra.

Peça a palavra de
pessoa apalavrada.

Personifique
parola peça
e não enfie a carapuça.
...

Passa mais uma palavra,
e mais outra, a espaços.

Passam-me as palavras,
sem que as possa apanhar
pelas pontas dos dedos.
Embaraços...
Empeço nos meus medos,
tropeço nos passos
perdidos à procura
das palavras perfeitas.

Preciso de uma palavra:
uma palavra bem passada,
se faz favor!

Palavras passadas...
Já me estou a passar!...

Palavra do Senhor!

...
(também há-de passar)



(AWF, Angra do Heroísmo, 26 de Outubro de 2017)

Calor...



Estico a chama no espaço
E no extremo do meu braço
Acendo o fogareiro.

Tremo tonto de cansaço...

Tanto tempo...

Conto o frio de Janeiro...

O fogo afasta o frio morto
todo em torno do meu corpo.
Mas não me dá porto, chão ou tecto,
chama que arde contrafeita
na ausência do afecto.

Temo o medo.
Meço o muro.

Metros e metros de enredo
Histórias tantas, tantos erros
enrolando e conspurcando o mundo!

Recolho-me...
Respiro-me...

E então recordo-te o regaço
o trato terno
o tenro traço
o teu rosto
o teu abraço...

Faz-me falta o teu abraço...

(O que faço?
O que desfaço?

Lá fora fecha o nevoeiro...)

Tomo-o.

Cubro-me de ti.

Aqueço-me

finalmente

inteiro.



(AWF, Angra do Heroísmo, 16 de Outubro de 2017)