segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Quando o cinto aperta...

... e as pessoas dizem "coitadinhos de nós" e se socorrem de muitas distracções para garantirem a sanidade mental própria esquecendo a dos outros, há quem nos diga que não é tempo para poesia.



Sim, eu sei: só o homem feliz
É querido. Sua voz
É ouvida com prazer. Seu rosto é belo.

A árvore aleijada no quintal
Indica o solo pobre, mas
Os passantes a maltratam por ser um aleijão
E estão certos.

Os barcos verdes e as velas alegres da baía
Eu não enxergo. De tudo
Vejo apenas a rede partida dos pescadores.
Por que falo apenas
Da camponesa de quarenta anos que anda curvada?
Os seios das meninas
São quentes como sempre.

Em minha canção uma rima
Me pareceria quase uma insolência.

Em mim lutam
O entusiasmo pela macieira que floresce
E o horror pelos discursos do pintor.
Mas apenas o segundo
Me conduz à escrivaninha.

(Brecht; poemas – 1913-1956. Trad. Paulo Cesar Souza. Brasiliense, 1986. p. 229.)

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