quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Crítica do sentido do míssil...

 

Hoje acordei com o míssil russo, que afinal parece ser ucraniano, caído na Polónia.

https://www.jornaldenegocios.pt/economia/europa/invasao-da-ucrania/detalhe/missil-russo-atinge-polonia-duas-pessoas-morreram

https://sicnoticias.pt/especiais/guerra-russia-ucrania/2022-11-16-Zelensky-insiste-que-missil-que-caiu-na-Polonia-e-russo-80f8d250

A mim não me interessa que seja russo ou ucraniano. O que é que isso significa, afinal? Que foi produzido, transportado, comprado e accionado por pessoas que nasceram ou vivem num determinado território do planeta e falam uma determinada língua? Que diferença me faz que falem ucraniano ou russo, se o míssil não deixa de ser um míssil, e se quem o lança o faz para matar e assim se faz besta? Quem é que tem mísseis e os lança por aí quando está mal disposto? O João? A Maria? Eu? Tu?... Quem é que se lembra de os produzir, para ganhar uma massas ou para quando der jeito? Tu? Eu? A Maria? O João?... Onde está aí a democracia?...

Levam-nos a acreditar que o míssil e o submarino são importantes para a nossa defesa. Nós acreditamos, sem nos lembrarmos que do outro lado, outros farão exactamente o mesmo, e também os ministros da guerra deles, tal como os nossos, se chamarão ministros da defesa. E sim, temos de concordar que são ministros da defesa… mas talvez devamos reflectir um segundo que seja sobre aquilo que estes senhores engravatados estarão realmente a defender. Ou então não acreditamos que os mísseis são importantes para a nossa defesa, mas como nos sentimos impotentes, nada fazemos. E assim, munidos do nosso silêncio ou anuência, os arautos da democracia à moda deles vão-nos aos bolsos, tirar o que amealhámos através do nosso trabalho, e zás, mísseis e submarinos.

E depois um deles, em vez de matar bem matadinhos os matadores inimigos, os maus, vai-se estatelar num tractor num campo qualquer lá para a raia da Polónia! O condutor do tractor certamente também não se deve ter importado muito se ele vinha de Este ou de Oeste ou de qualquer outro ponto cardinal. Caiu-lhe em cima, e ele foi-se, feito dano colateral da defesa da democracia à moda deles, sejam eles os bons ou os maus.

Interessa-me muito, preocupa-me sim, que quer sejam lançados ou não, quer atinjam os maus ou não, existam mísseis, sejam produzidos, sejam vendidos e comprados e utilizados ou simplesmente armazenados por gente engravatada que, não apenas esconde os benefícios próprios que retira desse negócio, mas ainda os mascara e propala como sendo o nosso próprio benefício.

Preocupa-me ainda mais que existam empresas da propaganda, aquelas a que alguns chamam de comunicação social, mesmo que sejam cada vez mais associais e que minem, directa e indirectamente, e cada vez mais, a comunicação, que existam tais empresas a darem-nos uma determinada visão do mundo, despudoradamente enviesada.

Se ninguém souber ao certo a história do míssil, invente-se então que foram os maus. E mesmo que depois se descubra que o míssil era dos bons, afirme-se que a responsabilidade continua a ser dos maus, porque, afinal, sem maus não eram necessários mísseis. Se se sabe ou não se sabe, não interessa. O que interessa é vender uma notícia. E como a notícia não é inócua, logo se faz notícia sobre a reacção dos senhores engravatados à notícia original.

Preocupa-me ainda mais que um banho de informação de qualidade não aferida não signifique, não implique, não gere, públicos de raciocínio lógico, ponderado, consequente. Pelo contrário, públicos de raciocínios ilógicos, imponderados e inconsequentes, ou de consequências negativas, até para si próprios, julgam-se senhores da razão, do conhecimento e do discernimento precisamente porque nadam num oceano de informação. Se a informação é desconexa, isso só a torna mais adequada!

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Já lá vão meses de guerra. Já chega? Ou será que ainda nos vamos manter agarrados à estratégia naïve, para não dizer mesmo inconsciente, para não dizer mesmo assassina, do “nós temos razão, só terminaremos a guerra quando os outros nos derem a razão, ou quando nos pudermos ver livres deles”?

Montaram para nós, com imensas máquinas de propaganda, as tais empresas da tal comunicação, ideias belas de democracias, mesmo que à moda deles, de princípios que não são implementados a não ser no mundo cor-de-rosa que criámos à sua conta. Incluíram, também para nós, um determinado território e as suas gentes, até então desconsiderados, na geografia da nossa democracia cor-de-rosa. Mostraram-nos como os maus são maus e colocaram isso tudo em causa. Sentimo-nos atingidos nas nossas ideias, na defesa, sempre a defesa, do nosso mundo cor-de-rosa. Armámos logo campanhas de recolha de bens do mesmo modo que fazemos para os animais domésticos abandonados, porque é assim que vemos a nossa participação na democracia à moda deles, que nós julgamos ser à nossa moda. Aceitámos sem pestanejar as sanções impostas contra os maus, primeiro inconscientes do impacto que teriam sobre nós mesmos, depois com orgulho do nosso empenho, do nosso sacrifício, em defesa dos valores proclamados, mesmo que tantas vezes esquecidos, pela nossa democracia. Agora papámos os preços e os juros altos, obra e graça de um sistema monetário maquiavélico supostamente construído para defesa dos nossos interesses económicos, e vemo-nos a braços com dificuldades económicas, mas continuamos a doar parte do nosso trabalho árduo para que o chefe dos bons, lá nessa terra distante, possa comprar mais armas aos outros chefes, que não têm nada a ver com isso, dizem eles, e assim possa mostrar aos maus o quanto eles estão errados. Benditos mísseis!...

Já chega de parvoíce?... Há gente a sofrer e a morrer… Já chega?

Vamos deixar de ser totós? Vamos perceber porque é que há gente a produzir mísseis, a vendê-los, a comprá-los, a armazená-los e a lançá-los? Vamos perceber porque é que existe esta pressão tão grande, de um lado e de outro, para não parar com a guerra? Vamos fazer um esforçozito para deixar de papar o que nos dá diariamente o grande Ministério da Verdade?

Enfim, deixo-vos com o texto do José Goulão, que já é velho de Março deste ano, mas que infelizmente é tão actual.

https://www.abrilabril.pt/internacional/torquemadas-do-pensamento

E um dia, quando esta guerra acabar, vamos fazer um esforçozito para olharmos por nós abaixo e vermos, por entre as instituições do nosso país, e outras em que o nosso país se insere ou com as quais alinha, como as da União Europeia, da ONU, dos Estados Unidos da América, de Israel e outros países, as atrocidades nas quais estivemos e ainda estamos envolvidos? Vamos fazer um esforçozito para perceber quão deficiente é esta democracia que nos venderam? E o quanto do nosso trabalho canalizam esses senhores engravatados na defesa dos interesses que são só deles e não são nossos? Vamos emancipar-nos um bocadito dos oligarcas, seja qual for o território onde eles nasceram ou onde vivem, e seja qual for a língua que falem? Pode ser? Ou será pedir muito?

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