sexta-feira, 26 de dezembro de 2014
O homem que plantava árvores...
Uma pequena animação que tive oportunidade de ver há uns meses atrás. Para lá da interpretação ecológica que pode ter, eu entendo-a como uma apologia à perseverança, à recompensa adiada, à dádiva, à luta, à poesia... ao seguir-se aquilo em que se acredita, independentemente das circunstâncias, movido pela esperança, senão apenas pelo sentido do dever cumprido, pelo ter de ser, pela procura da paz interior que nos assoma quando deixamos sair de dentro o que queríamos que fosse.
Todo o altruísmo é egoísta, pois sim, mas nem todo o egoísmo é altruísta. Terá o Adolfo, aquele do bigode, sido um homem que plantava árvores?... Levando a sua perseverança avante com chuveiros de gás?... Apesar do mundo... ou até contra o mundo?...
É assim que a utopia não é boa apenas por ser utopia, independentemente de saber se lá chegaremos ou não. É assim que a perspectiva ecológica ganha a sua importância, juntando a força para fazer à beleza do que se quer fazer. Cada um destes não é nada sem o outro.
E a metáfora de plantar árvores, já a conhecemos. Semeiam-se e plantam-se coisas vivas, que crescem e proliferam por seu próprio pé, por direito próprio. Plantam-se árvores porque elas demoram a crescer, bem mais do que nós demoramos a morrer, e porque nos são belas... De algum modo não imaginamos um homem que plantava árvores a trabalhar em plantações de eucaliptos... nem de acácias...
De algum modo, mesmo que nunca tenhamos ido a uma verdadeira floresta, as histórias de encantar já nos terão levado a extensos soutos, já nos terão levado a trepar pelos ramos de algum imenso carvalho centenário, já nos terão deitado à sombra de uma majestosa faia... São essas as árvores que vemos o homem a plantar. As que nos são mais belas.
De resto, como já alguém disse, as revoluções são cozinhadas pelos idealistas e sonhadores, servidas pelos lutadores e convictos, e comidas pelos homens práticos. E há já algum tempo que a boa psicologia positiva que nos tenta acossar advoga:
Sê prático, inteligente:
se alguém o fará por ti,
deixa o trabalho duro
e colhe o fruto maduro
da vida, simplesmente.
O mundo é uma maçã.
Alguém plantará hoje
as macieiras donde
comeremos amanhã.
terça-feira, 9 de dezembro de 2014
O detector de tretas...
Uma das coisas que mais me aflige em relação ao futuro da humanidade é verificar que as minhas previsões em relação à evolução da sua clarividência parecem confirmar-se, ano após ano. As previsões não são apenas minhas, de resto. De facto, à medida que os anos passam e que a escolaridade média da população com quem mais contacto (directa ou indirectamente) aumenta, à medida que o acesso à informação se torna cada vez mais simples e rápido, a clarividência da população não aumenta.
Esta não é uma afirmação científica, uma vez que não se baseia em nenhum estudo. É apenas a minha percepção. No entanto, poderia escrever um livro inteiro com exemplos do modo como as pessoas não desenvolveram como deveriam o seu detector de tretas, como lhe chamava Hemingway. E tivesse eu os recursos, estou certo que os estudos resultantes confirmariam esta percepção.
Detectar tretas não é algo que se possa fazer sem treino. Nenhum de nós nasce com um detector de tretas. Até o próprio conceito de treta tem de ser aprendido. E como não gosto de guerras de palavras, entendo aqui por treta, num sentido lato, todas as atitudes, acções e omissões, incluindo palavras, que um qualquer sujeito emprega para consciente ou inconscientemente nos enganar, isto é, para nos fazer acreditar em algo que não pode ser considerado verdadeiro.
É preciso muito treino para perceber as tretas do Passos Coelho. É preciso muito treino para perceber as tretas que nos chegam pelos noticiários na rádio, no jornal ou na televisão, todos os dias, e que nos são apresentadas como a mais suma verdade, verdadinha!
É preciso muito treino para perceber que forrar as estradas com lombas que ao serem pressionadas pelos automóveis que passam produzem energia que abastece os lampiões é uma treta. Não é que isso não se possa fazer! Pode, claro que sim. Mas é uma treta acreditar que isso é uma boa ideia ou uma boa coisa para se fazer.
É preciso muito treino para se perceber que a caridade é uma treta. Muito treino mesmo!... E é preciso ainda mais treino para perceber que o discurso da meritocracia ou do aumento da produtividade também são tretas.
A lista de tretas que devíamos ser capazes de detectar é infinita... assim um infinito da mesma ordem de grandeza que a infinita estupidez humana que o Einstein referia. Precisamente porque todos os dias há imensos seres humanos a inventar imensas novas tretas. Às vezes com malícia, às vezes sem malícia nenhuma... por simples ignorância.
Ao longo dos anos envolvi-me em muitas conversas em que alguém, já lá mais para o final, acabava por depositar as esperanças de um mundo melhor (fosse lá o que isso fosse) na educação das pessoas. Estas conversas, já se sabe, pressupõem sempre que os oradores são os detentores da verdade... Mas pronto... temos de ser benevolentes, se queremos uma boa e longa conversa à volta da fogueira, caso contrário a conversa termina logo num batente de cepticismo. Mas estas conversas assumem igualmente outros pressupostos, como por exemplo o pressuposto de que as pessoas não sabem o que precisam de aprender, se quisermos nem sequer sabem o que andam a fazer na vida, e que outros devem chegar-se à frente para lhes indicar o caminho.
Mas o mais engraçado desta ideia é precisamente que ela não passa de mais uma treta. Acreditar que um mundo melhor é uma consequência necessária do aumento da duração da educação formal das pessoas é uma treta. E acreditar que as pessoas podem aperfeiçoar o seu detector de tretas com mais anos de educação formal é também uma treta. O facto de gente muito instruída apregoar aquela primeira treta é só por si demonstrativo desta segunda treta.
A resposta sobre o que acontece quando a nível de educação da população aumenta depende, como é evidente, daquilo que entendemos por educação, daquilo que as pessoas estão efectivamente a fazer enquanto se “educam”, das condições que encontram no mundo para pôr em prática as suas ideias, etc, etc, etc.
E um problema que a educação formal que eu conheço tem é precisamente que em vez de ajudar as pessoas a desenvolverem o seu detector de tretas, desenvolve nas pessoas mecanismos de aceitação dócil de tretas! Vou mais longe, aliás, para dizer que aquilo que eu conheço do ensino formal em Portugal me leva a concluir que o ensino trata, ele mesmo, de enfiar uma data de tretas na cabeça das nossas "proto-pessoas"! Poderia listar um conjunto fastidioso dessas tretas...
É uma treta acreditar nos argumentos de autoridade que são inerentes ao ensino: a palavra do professor vale mais que a palavra do auxiliar de educação que por sua vez vale mais que a palavra do aluno; o que está escrito vale mais do que o que é dito, o que está escrito num texto bonito ou em bom português vale mais do que o que está escrito a vermelho nas costas de um envelope, o que está escrito num livro é quase certamente verdadeiro, o que está escrito no jornal é mesmo verdadeiro... Enfim, não vou continuar com estes exemplos.
Mas então como é que se faz para desenvolver o detector de tretas?
Do meu ponto de vista isso consegue-se apenas com método e tempo. Por isso falei atrás em treino, que me parece uma boa analogia. O método poderia dizer que não é mais nem menos que o científico. Isso parece pomposo, mas não é nada! É até bastante simples. Implica ser capaz de aceitar que não se sabe sobre um determinado assunto. Implica ser capaz de conviver bem com a dúvida. Implica ser capaz de rever tudo aquilo que podemos considerar as nossas certezas em função das novas informações que nos vão chegando e de estar disposto a deixá-las cair para aceitar uma outra versão das coisas. Implica ser curioso e querer sempre saber mais. Implica imaginar hipóteses sobre a realidade que nos rodeia. Implica não tentar “demonstrar” ou “provar” essas hipóteses, mas pelo contrário tentar refutar essas hipóteses (assim no estilo “eu acho que isto não parte, mas deixa-me testar... olha! partiu!”).
Como dizia alguém, que eu já não me lembro quem era, ciência é o que qualquer pessoa faz quando come uvas: come uma e avalia a sua doçura, come outra... e logo logo estará a extrapolar que as restantes uvas são todas como as primeiras... mas percebe que há alguma variabilidade nas uvas e de qualquer modo não está certo da sua extrapolação (que podemos chamar indução) e portanto vai provando mais uma e mais outra...
Provavelmente toda a gente que me lê está a pensar neste momento: ah, mas eu faço isso tudo! Eu afinal encaro o conhecimento e a sua aquisição de um ponto de vista científico!... Eu sou um cientista!
Infelizmente, na maior parte dos casos, não é isso que realmente se verifica. O ser humano precisa de colo, de mimo, de afago. E isso, ao nível da nossa mente, significa que todos gostamos de ter as nossas âncoras, as nossas certezas inabaláveis. Gostamos de andar pela nossa cabeça como quem anda numa casa de olhos fechados, sabendo exactamente o que é que lá está.
E é assim que as pessoas escolhem os seus gurus. Quase toda a gente que conheço tem os seus gurus. O que o guru diz ou faz é que é bom, é que é verdadeiro, e por aí vamos... Os gurus são intelectuais de alta roda (normalmente isso implica uma imagem de gente um pouco doida, que se deita muito tarde, que não dispensa uma droga qualquer de vez em quando e que tem outros comportamentos excêntricos), são cantores populares, são políticos, são escritores de livros...
É assim que as pessoas escolhem também as suas religiões. E uma data de outras coisas.
É assim que as pessoas dizem “prefiro nem saber!”. É assim que gostam de ler livros de autores já conhecidos, ver filmes com formatos já dominados, ouvir músicas com batida de quatro por quatro, bateria e guitarra. E é assim que quando os turistas portugueses vão até à Tailândia e a camioneta os deixa no centro da capital para almoçarem onde entenderem, eles logo correm para o primeiro restaurante português que encontram.
Mas para além desta “cientificidade” do método, ele possui um outro aspecto fundamental e que tem a ver com a selecção daquilo que se considera verdadeiro. É aqui, do meu ponto de vista, que a porca verdadeiramente torce o rabo!
A questão é que mais tarde ou mais cedo, no processo de interacção entre a nossa cabecita e o mundo, chega o momento em que temos de optar por aquilo que consideramos verdadeiro, rejeitando o resto. Temos de decidir se continuamos a acreditar que o Passos Coelho é uma pessoa escorreita apesar de termos um tipo à frente que nos tenta fazer acreditar que ele é um energúmeno. Temos de decidir se acreditamos na versão da CNN ou na versão da Al Jazeera da mesma notícia. Temos de decidir se é melhor acreditar no fazedor de opinião que está na moda ou se devemos começar a pensar pela nossa própria cabeça e começar a procurar informação noutras fontes.
A verdade é que, por mais científicos que sejamos, e mesmo para os que se apelidam de cientistas, quando se trata de decidir pela versão A ou pela versão B da mesma realidade, a nossa escolha é sempre uma questão de fé. Sempre. Nem que seja fé nos resultados da experiência super controlada que nós próprios acabámos de realizar.
O busílis da questão é então o de saber como nos haveremos de conduzir nestas tomadas de decisão, por que caminhos e como haveremos nós de conduzir a nossa fé.
Como já disse, há quem conduza a sua fé indo atrás de um guru qualquer e já está!
Se, porém, queremos desenvolver um bom detector de tretas, devemos conduzir a nossa fé por comparação com todo o nosso conhecimento e toda a nossa experiência adquirida. Devemos, conforme já referi, ter uma atitude científica e submeter ao teste mesmo as certezas que consideramos mais inabaláveis. E ir, desse modo, acumulando um conjunto de conhecimentos que podemos considerar “testados”. Cada nova decisão que tenhamos de tomar deverá ser então feita através de comparação com esse conhecimento adquirido.
No entanto, há proposições que são para nós quase impossíveis de testar: por exemplo, como poderemos testar, sem nenhum auxílio mirabolante, a influência que a posição dos planetas tem na nossa vida? Ou como poderemos nós testar se o Passos Coelho é um aldrabão?... As decisões que tomarmos acerca destas hipóteses ficarão acumuladas como conhecimento “não testado”. Não deixa de ser conhecimento. Mas o facto de não podermos testar algumas das coisas em que decidimos acreditar, deve-nos fazer desconfiar um pouco mais delas.
O tempo é então essencial para permitir a confrontação do nosso conhecimento adquirido com as novas realidades que vamos vivendo, para permitir o estabelecimento de ligações entre todos estes dados que estão à partida mais isolados, para permitir, enfim, a constituição de uma rede de referência, um crivo de referência, um detector de tretas, através do qual devermos fazer passar tudo o que nos dão.
Este é um processo que é intimamente pessoal. Ninguém pode criar noutra pessoa um bom detector de tretas. Não é algo que se ensine. Só com vontade própria se chega lá...
Resta então saber se, para cada um de nós, isso valerá a pena.
Infelizmente, do meu ponto de vista, eu sei que há muitíssimas pessoas para quem isso não vale a pena. A questão, como outro alguém dizia, não está no que as pessoas passivamente desconhecem, mas naquilo que activamente não querem conhecer! As drogas, num sentido lato, desde as viagens rápidas às séries televisivas, passando pelos cafés, são demonstrações de como as pessoas preferem mimos a quererem conhecer a por vezes dura realidade dos factos.
So... help us God.
Esta não é uma afirmação científica, uma vez que não se baseia em nenhum estudo. É apenas a minha percepção. No entanto, poderia escrever um livro inteiro com exemplos do modo como as pessoas não desenvolveram como deveriam o seu detector de tretas, como lhe chamava Hemingway. E tivesse eu os recursos, estou certo que os estudos resultantes confirmariam esta percepção.
Detectar tretas não é algo que se possa fazer sem treino. Nenhum de nós nasce com um detector de tretas. Até o próprio conceito de treta tem de ser aprendido. E como não gosto de guerras de palavras, entendo aqui por treta, num sentido lato, todas as atitudes, acções e omissões, incluindo palavras, que um qualquer sujeito emprega para consciente ou inconscientemente nos enganar, isto é, para nos fazer acreditar em algo que não pode ser considerado verdadeiro.
É preciso muito treino para perceber as tretas do Passos Coelho. É preciso muito treino para perceber as tretas que nos chegam pelos noticiários na rádio, no jornal ou na televisão, todos os dias, e que nos são apresentadas como a mais suma verdade, verdadinha!
É preciso muito treino para perceber que forrar as estradas com lombas que ao serem pressionadas pelos automóveis que passam produzem energia que abastece os lampiões é uma treta. Não é que isso não se possa fazer! Pode, claro que sim. Mas é uma treta acreditar que isso é uma boa ideia ou uma boa coisa para se fazer.
É preciso muito treino para se perceber que a caridade é uma treta. Muito treino mesmo!... E é preciso ainda mais treino para perceber que o discurso da meritocracia ou do aumento da produtividade também são tretas.
A lista de tretas que devíamos ser capazes de detectar é infinita... assim um infinito da mesma ordem de grandeza que a infinita estupidez humana que o Einstein referia. Precisamente porque todos os dias há imensos seres humanos a inventar imensas novas tretas. Às vezes com malícia, às vezes sem malícia nenhuma... por simples ignorância.
Ao longo dos anos envolvi-me em muitas conversas em que alguém, já lá mais para o final, acabava por depositar as esperanças de um mundo melhor (fosse lá o que isso fosse) na educação das pessoas. Estas conversas, já se sabe, pressupõem sempre que os oradores são os detentores da verdade... Mas pronto... temos de ser benevolentes, se queremos uma boa e longa conversa à volta da fogueira, caso contrário a conversa termina logo num batente de cepticismo. Mas estas conversas assumem igualmente outros pressupostos, como por exemplo o pressuposto de que as pessoas não sabem o que precisam de aprender, se quisermos nem sequer sabem o que andam a fazer na vida, e que outros devem chegar-se à frente para lhes indicar o caminho.
Mas o mais engraçado desta ideia é precisamente que ela não passa de mais uma treta. Acreditar que um mundo melhor é uma consequência necessária do aumento da duração da educação formal das pessoas é uma treta. E acreditar que as pessoas podem aperfeiçoar o seu detector de tretas com mais anos de educação formal é também uma treta. O facto de gente muito instruída apregoar aquela primeira treta é só por si demonstrativo desta segunda treta.
A resposta sobre o que acontece quando a nível de educação da população aumenta depende, como é evidente, daquilo que entendemos por educação, daquilo que as pessoas estão efectivamente a fazer enquanto se “educam”, das condições que encontram no mundo para pôr em prática as suas ideias, etc, etc, etc.
E um problema que a educação formal que eu conheço tem é precisamente que em vez de ajudar as pessoas a desenvolverem o seu detector de tretas, desenvolve nas pessoas mecanismos de aceitação dócil de tretas! Vou mais longe, aliás, para dizer que aquilo que eu conheço do ensino formal em Portugal me leva a concluir que o ensino trata, ele mesmo, de enfiar uma data de tretas na cabeça das nossas "proto-pessoas"! Poderia listar um conjunto fastidioso dessas tretas...
É uma treta acreditar nos argumentos de autoridade que são inerentes ao ensino: a palavra do professor vale mais que a palavra do auxiliar de educação que por sua vez vale mais que a palavra do aluno; o que está escrito vale mais do que o que é dito, o que está escrito num texto bonito ou em bom português vale mais do que o que está escrito a vermelho nas costas de um envelope, o que está escrito num livro é quase certamente verdadeiro, o que está escrito no jornal é mesmo verdadeiro... Enfim, não vou continuar com estes exemplos.
Mas então como é que se faz para desenvolver o detector de tretas?
Do meu ponto de vista isso consegue-se apenas com método e tempo. Por isso falei atrás em treino, que me parece uma boa analogia. O método poderia dizer que não é mais nem menos que o científico. Isso parece pomposo, mas não é nada! É até bastante simples. Implica ser capaz de aceitar que não se sabe sobre um determinado assunto. Implica ser capaz de conviver bem com a dúvida. Implica ser capaz de rever tudo aquilo que podemos considerar as nossas certezas em função das novas informações que nos vão chegando e de estar disposto a deixá-las cair para aceitar uma outra versão das coisas. Implica ser curioso e querer sempre saber mais. Implica imaginar hipóteses sobre a realidade que nos rodeia. Implica não tentar “demonstrar” ou “provar” essas hipóteses, mas pelo contrário tentar refutar essas hipóteses (assim no estilo “eu acho que isto não parte, mas deixa-me testar... olha! partiu!”).
Como dizia alguém, que eu já não me lembro quem era, ciência é o que qualquer pessoa faz quando come uvas: come uma e avalia a sua doçura, come outra... e logo logo estará a extrapolar que as restantes uvas são todas como as primeiras... mas percebe que há alguma variabilidade nas uvas e de qualquer modo não está certo da sua extrapolação (que podemos chamar indução) e portanto vai provando mais uma e mais outra...
Provavelmente toda a gente que me lê está a pensar neste momento: ah, mas eu faço isso tudo! Eu afinal encaro o conhecimento e a sua aquisição de um ponto de vista científico!... Eu sou um cientista!
Infelizmente, na maior parte dos casos, não é isso que realmente se verifica. O ser humano precisa de colo, de mimo, de afago. E isso, ao nível da nossa mente, significa que todos gostamos de ter as nossas âncoras, as nossas certezas inabaláveis. Gostamos de andar pela nossa cabeça como quem anda numa casa de olhos fechados, sabendo exactamente o que é que lá está.
E é assim que as pessoas escolhem os seus gurus. Quase toda a gente que conheço tem os seus gurus. O que o guru diz ou faz é que é bom, é que é verdadeiro, e por aí vamos... Os gurus são intelectuais de alta roda (normalmente isso implica uma imagem de gente um pouco doida, que se deita muito tarde, que não dispensa uma droga qualquer de vez em quando e que tem outros comportamentos excêntricos), são cantores populares, são políticos, são escritores de livros...
É assim que as pessoas escolhem também as suas religiões. E uma data de outras coisas.
É assim que as pessoas dizem “prefiro nem saber!”. É assim que gostam de ler livros de autores já conhecidos, ver filmes com formatos já dominados, ouvir músicas com batida de quatro por quatro, bateria e guitarra. E é assim que quando os turistas portugueses vão até à Tailândia e a camioneta os deixa no centro da capital para almoçarem onde entenderem, eles logo correm para o primeiro restaurante português que encontram.
Mas para além desta “cientificidade” do método, ele possui um outro aspecto fundamental e que tem a ver com a selecção daquilo que se considera verdadeiro. É aqui, do meu ponto de vista, que a porca verdadeiramente torce o rabo!
A questão é que mais tarde ou mais cedo, no processo de interacção entre a nossa cabecita e o mundo, chega o momento em que temos de optar por aquilo que consideramos verdadeiro, rejeitando o resto. Temos de decidir se continuamos a acreditar que o Passos Coelho é uma pessoa escorreita apesar de termos um tipo à frente que nos tenta fazer acreditar que ele é um energúmeno. Temos de decidir se acreditamos na versão da CNN ou na versão da Al Jazeera da mesma notícia. Temos de decidir se é melhor acreditar no fazedor de opinião que está na moda ou se devemos começar a pensar pela nossa própria cabeça e começar a procurar informação noutras fontes.
A verdade é que, por mais científicos que sejamos, e mesmo para os que se apelidam de cientistas, quando se trata de decidir pela versão A ou pela versão B da mesma realidade, a nossa escolha é sempre uma questão de fé. Sempre. Nem que seja fé nos resultados da experiência super controlada que nós próprios acabámos de realizar.
O busílis da questão é então o de saber como nos haveremos de conduzir nestas tomadas de decisão, por que caminhos e como haveremos nós de conduzir a nossa fé.
Como já disse, há quem conduza a sua fé indo atrás de um guru qualquer e já está!
Se, porém, queremos desenvolver um bom detector de tretas, devemos conduzir a nossa fé por comparação com todo o nosso conhecimento e toda a nossa experiência adquirida. Devemos, conforme já referi, ter uma atitude científica e submeter ao teste mesmo as certezas que consideramos mais inabaláveis. E ir, desse modo, acumulando um conjunto de conhecimentos que podemos considerar “testados”. Cada nova decisão que tenhamos de tomar deverá ser então feita através de comparação com esse conhecimento adquirido.
No entanto, há proposições que são para nós quase impossíveis de testar: por exemplo, como poderemos testar, sem nenhum auxílio mirabolante, a influência que a posição dos planetas tem na nossa vida? Ou como poderemos nós testar se o Passos Coelho é um aldrabão?... As decisões que tomarmos acerca destas hipóteses ficarão acumuladas como conhecimento “não testado”. Não deixa de ser conhecimento. Mas o facto de não podermos testar algumas das coisas em que decidimos acreditar, deve-nos fazer desconfiar um pouco mais delas.
O tempo é então essencial para permitir a confrontação do nosso conhecimento adquirido com as novas realidades que vamos vivendo, para permitir o estabelecimento de ligações entre todos estes dados que estão à partida mais isolados, para permitir, enfim, a constituição de uma rede de referência, um crivo de referência, um detector de tretas, através do qual devermos fazer passar tudo o que nos dão.
Este é um processo que é intimamente pessoal. Ninguém pode criar noutra pessoa um bom detector de tretas. Não é algo que se ensine. Só com vontade própria se chega lá...
Resta então saber se, para cada um de nós, isso valerá a pena.
Infelizmente, do meu ponto de vista, eu sei que há muitíssimas pessoas para quem isso não vale a pena. A questão, como outro alguém dizia, não está no que as pessoas passivamente desconhecem, mas naquilo que activamente não querem conhecer! As drogas, num sentido lato, desde as viagens rápidas às séries televisivas, passando pelos cafés, são demonstrações de como as pessoas preferem mimos a quererem conhecer a por vezes dura realidade dos factos.
So... help us God.
domingo, 12 de outubro de 2014
Para o meu filho, que ainda não nasceu...
Se soubesses como és querido, filho...
Aqui, por todo o lado, todos te querem, filho. Preocupam-se que não nasças, dizem que a natalidade está muito baixa. Por isso desejam bebés e querem-te a ti também, filho.
Alguns têm medo de não ter dinheiro quando já não puderem trabalhar, e contam contigo para trabalhares para eles. Ficarás então incumbido de trabalhar muito e bem para os outros. Quanto mais próximas as pessoas forem de ti, mais quererão que trabalhes muito e bem. Chamarão a isso sucesso. E para que possas ter muito sucesso, essas pessoas quererão que aprendas muitas coisas. Mas as coisas certas! Não quererão que aprendas a falar mirandês, que isso não serve para nada, mas inglês, que é a língua dos negócios. Não quererão que aprendas a questionar, não vás tu questionar o mundo e questioná-los a eles, mas antes quererão que decores, enumeres e nomeies todas as coisas, para assim poderes deixar de pensar nelas enquanto te tornas num campeão da trivialidade que lhes é tão querida. Não quererão que aprendas na rua, nem com os amigos, nem com os pais, muito menos na tua própria vivência, mas sim num instituto de renome que emita diplomas valorizados pelos mais poderosos do planeta.
Dir-te-ão que é tudo para o teu bem, filho. E para o teu bem tentarão fazer de ti o super-homem...
Por aqui, por todo o lado, todos te querem muito. Há quem se sinta mal num mundo com poucas crianças, sabes? Dizem que as crianças são alegria, porque já não a conseguem encontrar em si próprios ou à sua volta, no mundo dos adultos. Perderam a alegria e a esperança de a encontrar ou construir. E por isso dizem que as crianças são esperança. Mas não tenhas tu tantas esperanças, filho, porque não te irão deixar construir um mundo melhor. Enquanto fores criança, precisamente quando virem em ti a esperança com pernas, dir-te-ão que não, que não podes, porque não sabes, porque não atinges, ainda tens muito para aprender. Depois, quando já fores maior que a esperança deles, dar-te-ão todas as justificações para que nunca possas mudar nada, para que nunca corram o risco de perder o que já têm e para que nunca entendas que afinal o medo deles foi sempre muito maior que a esperança.
Ficas então a saber, meu filho, que te quererão muito enquanto bebé, mas que depois te quererão cada vez menos, e estarão prontos a deitar-te ao lixo quando fores velho. A menos que trabalhes muito e bem. Que tenhas muito sucesso. Mas não te enganes: trabalhar bem não significa fazer as coisas bem feitas. Significa ganhar muito dinheiro. Só isso. Depois, se tiveres muito sucesso, poderás então ajudar muita gente. Ajudar não significa motivar, alertar, cooperar... significa apenas dar dinheiro. Os teus próprios familiares, quando não tiverem forças para tomarem banho sozinhos, preferirão que tenhas sucesso e lhes compres um robot a que lhes dês o banho tu mesmo.
Mas como te querem, filho... Precisam de bebés para se entreterem, porque eles nunca foram capazes de se entreter por sua conta. Cedo lhes mataram a curiosidade e eles nada fizeram para a ressuscitar. Por isso irão deliciar-se com a tua curiosidade. Mas também a irão matar, filho... Para o teu próprio bem! Porque este mundo está cheio de perigos, dizem. Eles nunca os viveram, mas sabem bem que é assim, porque os vêem todos os dias na televisão. Assim, porque te querem muito, nunca te deixarão andar sozinho na rua, nem sequer acompanhado pelos teus amigos. Dar-te-ão instruções para nunca falares com estranhos de tal modo que todos à tua volta continuarão a ser estranhos pela vida fora. Todas as esquinas ficarão protegidas com peças de plástico e borracha, as facas os medicamentos os electrodomésticos o isqueiro ficarão trancados a sete chaves, e tu próprio andarás escudado em capacetes e cotoveleiras. Porque eles sabem que este mundo é mesmo muito mau, depositar-te-ão numa redoma, a ti e à esperança, e farão o possível e o impossível para que nunca tenhas de aprender a viver no mundo real e para que nunca chegues a saber ao que sabe o sangue.
Por minha conta, meu filho, serás muito amado. Como se fosse uma parte de mim. Porque o serás. Serás amado pelos teus genes e pelo orgulho que me darás ao espalhares pelo mundo o tanto que te quero ensinar. Serás tão amado quanto fores eu.
Só não penses que virás ao mundo para o fazeres teu, ou sequer para seres tu.
Aqui, por todo o lado, todos te querem, filho. Preocupam-se que não nasças, dizem que a natalidade está muito baixa. Por isso desejam bebés e querem-te a ti também, filho.
Alguns têm medo de não ter dinheiro quando já não puderem trabalhar, e contam contigo para trabalhares para eles. Ficarás então incumbido de trabalhar muito e bem para os outros. Quanto mais próximas as pessoas forem de ti, mais quererão que trabalhes muito e bem. Chamarão a isso sucesso. E para que possas ter muito sucesso, essas pessoas quererão que aprendas muitas coisas. Mas as coisas certas! Não quererão que aprendas a falar mirandês, que isso não serve para nada, mas inglês, que é a língua dos negócios. Não quererão que aprendas a questionar, não vás tu questionar o mundo e questioná-los a eles, mas antes quererão que decores, enumeres e nomeies todas as coisas, para assim poderes deixar de pensar nelas enquanto te tornas num campeão da trivialidade que lhes é tão querida. Não quererão que aprendas na rua, nem com os amigos, nem com os pais, muito menos na tua própria vivência, mas sim num instituto de renome que emita diplomas valorizados pelos mais poderosos do planeta.
Dir-te-ão que é tudo para o teu bem, filho. E para o teu bem tentarão fazer de ti o super-homem...
Por aqui, por todo o lado, todos te querem muito. Há quem se sinta mal num mundo com poucas crianças, sabes? Dizem que as crianças são alegria, porque já não a conseguem encontrar em si próprios ou à sua volta, no mundo dos adultos. Perderam a alegria e a esperança de a encontrar ou construir. E por isso dizem que as crianças são esperança. Mas não tenhas tu tantas esperanças, filho, porque não te irão deixar construir um mundo melhor. Enquanto fores criança, precisamente quando virem em ti a esperança com pernas, dir-te-ão que não, que não podes, porque não sabes, porque não atinges, ainda tens muito para aprender. Depois, quando já fores maior que a esperança deles, dar-te-ão todas as justificações para que nunca possas mudar nada, para que nunca corram o risco de perder o que já têm e para que nunca entendas que afinal o medo deles foi sempre muito maior que a esperança.
Ficas então a saber, meu filho, que te quererão muito enquanto bebé, mas que depois te quererão cada vez menos, e estarão prontos a deitar-te ao lixo quando fores velho. A menos que trabalhes muito e bem. Que tenhas muito sucesso. Mas não te enganes: trabalhar bem não significa fazer as coisas bem feitas. Significa ganhar muito dinheiro. Só isso. Depois, se tiveres muito sucesso, poderás então ajudar muita gente. Ajudar não significa motivar, alertar, cooperar... significa apenas dar dinheiro. Os teus próprios familiares, quando não tiverem forças para tomarem banho sozinhos, preferirão que tenhas sucesso e lhes compres um robot a que lhes dês o banho tu mesmo.
Mas como te querem, filho... Precisam de bebés para se entreterem, porque eles nunca foram capazes de se entreter por sua conta. Cedo lhes mataram a curiosidade e eles nada fizeram para a ressuscitar. Por isso irão deliciar-se com a tua curiosidade. Mas também a irão matar, filho... Para o teu próprio bem! Porque este mundo está cheio de perigos, dizem. Eles nunca os viveram, mas sabem bem que é assim, porque os vêem todos os dias na televisão. Assim, porque te querem muito, nunca te deixarão andar sozinho na rua, nem sequer acompanhado pelos teus amigos. Dar-te-ão instruções para nunca falares com estranhos de tal modo que todos à tua volta continuarão a ser estranhos pela vida fora. Todas as esquinas ficarão protegidas com peças de plástico e borracha, as facas os medicamentos os electrodomésticos o isqueiro ficarão trancados a sete chaves, e tu próprio andarás escudado em capacetes e cotoveleiras. Porque eles sabem que este mundo é mesmo muito mau, depositar-te-ão numa redoma, a ti e à esperança, e farão o possível e o impossível para que nunca tenhas de aprender a viver no mundo real e para que nunca chegues a saber ao que sabe o sangue.
Por minha conta, meu filho, serás muito amado. Como se fosse uma parte de mim. Porque o serás. Serás amado pelos teus genes e pelo orgulho que me darás ao espalhares pelo mundo o tanto que te quero ensinar. Serás tão amado quanto fores eu.
Só não penses que virás ao mundo para o fazeres teu, ou sequer para seres tu.
quinta-feira, 10 de julho de 2014
Os ricos, os ricos...
A este monumento da Manuela, se pudesse, Almeida Garrett, numa passagem de "Viagens na minha terra":
"Andai, ganha-pães, andai; reduzi tudo a cifras, todas as considerações deste mundo a equações de interesse corporal, comprai, vendei, agiotai. No fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana? Que há mais umas poucas dúzias de homens ricos. E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar a miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico? - Que lho digam no Parlamento inglês, onde, depois de tantas comissões de inquérito, já devia andar orçado o número de almas que é preciso vender ao diabo, número de corpos que se tem de entregar antes do tempo ao cemitério para fazer um tecelão rico e fidalgo como Sir Robert Peel, um mineiro, um banqueiro, um granjeeiro, seja o que for: cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis."
Se fosse eu, diria assim: como é que se faz um rico?... Pega-se num balde de merda... Não, não vou por aí. Vamos antes reduzir tudo a cifras, como os ricos entendem. Um rico faz-se com o suor do rosto?... Vejamos: se uma pessoa trabalhar muito e do seu trabalho honesto conseguir poupar 1000 euros por mês, ao fim de 50 anos de trabalho terá conseguido poupar 600 mil euros. Isso dá uma grande moradia, talvez... Não me parece que seja o suficiente para classificar alguém como rico. Como é que se faz um rico?...
E como é que se desfaz?...
Coitadinhos!...
terça-feira, 8 de julho de 2014
Joe Hisaishi...
Mas como não sou surdo...
Os filmes do Miyazaki, as sensações, os sentimentos, e sobretudo as memórias... os afectos... as memórias dos afectos... que são sempre o que mais perdura.
Os filmes do Miyazaki, as sensações, os sentimentos, e sobretudo as memórias... os afectos... as memórias dos afectos... que são sempre o que mais perdura.
quarta-feira, 25 de junho de 2014
Se eu fosse surdo...
...os aviões afectar-me-iam à mesma.
Este é o aspecto do sinal de um aparelho que eu tentava analisar ontem, no qual o efeito da passagem dos aviões é bem visível:
O aparelho que estava a analisar é uma balança para utilização em túnel de vento:
Este é o aspecto do sinal de um aparelho que eu tentava analisar ontem, no qual o efeito da passagem dos aviões é bem visível:
O aparelho que estava a analisar é uma balança para utilização em túnel de vento:
quinta-feira, 19 de junho de 2014
O esforço de ser simples...
A vida inteira a preparar o imprevisto
e depois isto
tudo conforme o plano...
ao desengano
no desvio pouco sadio
do vazio quotidiano.
Vai-se a ver e é mesmo assim
assim-assim...
Longe o canto do chapim
guardadas as notas no piano...
a vida a andar às voltas
num sem-fim
ano após ano.
E apesar de tudo
insisto
no querer fazer um mundo disto.
Se de tão longe vim
e fiz o meu caminho caminhando
se sou alecrim
que suporta o sol a seca e o solo mais ruim
e apesar de tudo vai medrando.
Se o meu sonho é construído em mim
sem no céu azul haver clarim
mas tão só o cheiro a avião em meio urbano,
não desisto!
de fazer desta humanidade
um o que quer que seja mais humano.
De no seio do ser rasgar enfim
um olhar mais fundo
e sem plano:
viver a vida!
Ouvir o canto do chapim,
amar o amor até ao fim,
aumentar em três as notas do piano.
awf, 10/06/2014
e depois isto
tudo conforme o plano...
ao desengano
no desvio pouco sadio
do vazio quotidiano.
Vai-se a ver e é mesmo assim
assim-assim...
Longe o canto do chapim
guardadas as notas no piano...
a vida a andar às voltas
num sem-fim
ano após ano.
E apesar de tudo
insisto
no querer fazer um mundo disto.
Se de tão longe vim
e fiz o meu caminho caminhando
se sou alecrim
que suporta o sol a seca e o solo mais ruim
e apesar de tudo vai medrando.
Se o meu sonho é construído em mim
sem no céu azul haver clarim
mas tão só o cheiro a avião em meio urbano,
não desisto!
de fazer desta humanidade
um o que quer que seja mais humano.
De no seio do ser rasgar enfim
um olhar mais fundo
e sem plano:
viver a vida!
Ouvir o canto do chapim,
amar o amor até ao fim,
aumentar em três as notas do piano.
awf, 10/06/2014
sexta-feira, 6 de junho de 2014
Não fora o mar!...
de Fernanda de Castro:
Não fora o mar,
e eu seria feliz na minha rua,
neste primeiro andar da minha casa
a ver, de dia, o sol, de noite a lua,
calada, quieta, sem um golpe de asa.
Não fora o mar,
e seriam contados os meus passos,
tantos para viver, para morrer,
tantos os movimentos dos meus braços,
pequena angústia, pequeno prazer.
Não fora o mar,
e os seus sonhos seriam sem violência
como irisadas bolas de sabão,
efémero cristal, branca aparência,
e o resto — pingos de água em minha mão.
Não fora o mar,
e este cruel desejo de aventura
seria vaga música ao sol pôr
nem sequer brasa viva, queimadura,
pouco mais que o perfume duma flor.
Não fora o mar
e o longo apelo, o canto da sereia,
apenas ilusão, miragem,
breve canção, passo breve na areia,
desejo balbuciante de viagem.
Não fora o mar
e, resignada, em vez de olhar os astros
tudo o que é alto, inacessível, fundo,
cimos, castelos, torres, nuvens, mastros,
iria de olhos baixos pelo mundo.
Não fora o mar
e o meu canto seria flor e mel,
asa de borboleta, rouxinol,
e não rude halali, garra cruel,
Águia Real que desafia o sol.
Não fora o mar
e este potro selvagem, sem arção,
crinas ao vento, com arreio,
meu altivo, indomável coração,
Não fora o mar
e comeria à mão,
não fora o mar
e aceitaria o freio.
Não fora o mar,
e eu seria feliz na minha rua,
neste primeiro andar da minha casa
a ver, de dia, o sol, de noite a lua,
calada, quieta, sem um golpe de asa.
Não fora o mar,
e seriam contados os meus passos,
tantos para viver, para morrer,
tantos os movimentos dos meus braços,
pequena angústia, pequeno prazer.
Não fora o mar,
e os seus sonhos seriam sem violência
como irisadas bolas de sabão,
efémero cristal, branca aparência,
e o resto — pingos de água em minha mão.
Não fora o mar,
e este cruel desejo de aventura
seria vaga música ao sol pôr
nem sequer brasa viva, queimadura,
pouco mais que o perfume duma flor.
Não fora o mar
e o longo apelo, o canto da sereia,
apenas ilusão, miragem,
breve canção, passo breve na areia,
desejo balbuciante de viagem.
Não fora o mar
e, resignada, em vez de olhar os astros
tudo o que é alto, inacessível, fundo,
cimos, castelos, torres, nuvens, mastros,
iria de olhos baixos pelo mundo.
Não fora o mar
e o meu canto seria flor e mel,
asa de borboleta, rouxinol,
e não rude halali, garra cruel,
Águia Real que desafia o sol.
Não fora o mar
e este potro selvagem, sem arção,
crinas ao vento, com arreio,
meu altivo, indomável coração,
Não fora o mar
e comeria à mão,
não fora o mar
e aceitaria o freio.
segunda-feira, 2 de junho de 2014
sexta-feira, 23 de maio de 2014
Os aviões da bola...
Amanhã, dia 24 de Maio de 2014, ocorrerá em Lisboa um jogo de futebol. O futebol é um jogo onde duas equipas de onze pessoas cada tentam meter uma bola dentro de uma baliza. Por causa disso a cidade será invadida, segundo as notícias desta manhã, por 120.000 pessoas vindas do país do lado.
Essas pessoas chegarão à cidade em carros, comboios, autocarros, barcos, bicicletas, patins e aviões. Segundo as mesmas notícias, só amanhã chegarão ao aeroporto da Portela 740 aviões.
O local do meu trabalho é praticamente contíguo ao aeroporto, e para maior sorte, alinhado com a pista principal. Portanto dou graças a um senhor qualquer por não estar em Lisboa amanhã!... E não será apenas por causa dos aviões!...
Dediquei-me a fazer algumas contas. Com base em informação dispersa na Internet (e não deixa de ser curioso esta informação não estar concentrada, de modo que qualquer cidadão que coloque perguntas a esse respeito encontre respostas claras e rápidas...) tentei calcular quanto é que isso significaria de consumo de combustível só na atmosfera que rodeia as cabeças dos lisboetas.
Os dados seguintes podem e devem ser utilizados para outro tipo de cálculos, portanto penso que são úteis para qualquer pessoa que prefira pensar pelos seus próprios neurónios. Afinal, quase toda a gente sabe que um carro normal consome qualquer coisa como 5 litros de combustível por cada 100 quilómetros, não é verdade?...
Se considerarmos que os aviões que descolam também têm de aterrar, vemos que o jogo de futebol vai permitir aos lisboetas respirar os produtos da combustão de mais de um milhão de quilogramas de combustível!...
Mas vá, para que não fiquemos tão alarmados, comparemos isso com o consumo de combustível dos automóveis. Admitindo que há um milhão de automóveis em Lisboa (há mais, podem procurar as estatísticas aqui), que cada um deles anda em média uns 25 km por dia e que consome em média uns 4 kg de combustível por cada 100 km, isso dá precisamente um milhão de kg de combustível por dia.
Portanto os aviões que teremos a mais por causa do jogo de futebol contribuirão tanto para a poluição da cidade como o tráfego automóvel de um dia.
Estes grandes números são assustadores... e devem fazer-nos pensar.
Essas pessoas chegarão à cidade em carros, comboios, autocarros, barcos, bicicletas, patins e aviões. Segundo as mesmas notícias, só amanhã chegarão ao aeroporto da Portela 740 aviões.
O local do meu trabalho é praticamente contíguo ao aeroporto, e para maior sorte, alinhado com a pista principal. Portanto dou graças a um senhor qualquer por não estar em Lisboa amanhã!... E não será apenas por causa dos aviões!...
Dediquei-me a fazer algumas contas. Com base em informação dispersa na Internet (e não deixa de ser curioso esta informação não estar concentrada, de modo que qualquer cidadão que coloque perguntas a esse respeito encontre respostas claras e rápidas...) tentei calcular quanto é que isso significaria de consumo de combustível só na atmosfera que rodeia as cabeças dos lisboetas.
Os dados seguintes podem e devem ser utilizados para outro tipo de cálculos, portanto penso que são úteis para qualquer pessoa que prefira pensar pelos seus próprios neurónios. Afinal, quase toda a gente sabe que um carro normal consome qualquer coisa como 5 litros de combustível por cada 100 quilómetros, não é verdade?...
- Um avião de passageiros a jacto, um avião normalíssimo da costa, possui motores com uma capacidade de propulsão máxima de aproximadamente 200 kg por cada passageiro.
- O consumo de um desses motores é de aproximadamente 0,6 kg de combustível por cada kg de propulsão e por hora, quando à velocidade máxima, e cerca de 0,3 kg quando à velocidade mínima.
Se considerarmos que os aviões que descolam também têm de aterrar, vemos que o jogo de futebol vai permitir aos lisboetas respirar os produtos da combustão de mais de um milhão de quilogramas de combustível!...
Mas vá, para que não fiquemos tão alarmados, comparemos isso com o consumo de combustível dos automóveis. Admitindo que há um milhão de automóveis em Lisboa (há mais, podem procurar as estatísticas aqui), que cada um deles anda em média uns 25 km por dia e que consome em média uns 4 kg de combustível por cada 100 km, isso dá precisamente um milhão de kg de combustível por dia.
Portanto os aviões que teremos a mais por causa do jogo de futebol contribuirão tanto para a poluição da cidade como o tráfego automóvel de um dia.
Estes grandes números são assustadores... e devem fazer-nos pensar.
segunda-feira, 19 de maio de 2014
Investimentos públicos em tempo de vacas esqueléticas...
Tenho passado alguns dias nos últimos meses pelas bandas de Matosinhos. Não pude deixar de reparar na colossal picadora 1-2-3 que alguém deixou cair num dos paredões do Porto de Leixões.
Trata-se, vim a saber, de um "terminal" para os muitos milhares de passageiros de paquetes que alguém espera vir a receber no futuro.
Noutro dia, já em Lisboa, deu-me para pensar (erros meus, má fortuna...) sobre o custo daquilo e sobre quem estará a financiar a obra. Ocorreu-me, sabe-se lá porquê, que às tantas era eu mesmo que estava a financiar aquilo!... Fui à procura e descobri que sim, que eu, tu, e muitos outros como nós, andamos a financiar a construção da mega-picadora em betão armado.
"Este projecto, da autoria do Arq. Luís Pedro Silva, com um investimento global na ordem dos 49 milhões de euros, foi financiado pelo Programa Operacional Regional do Norte 2007/2013, no âmbito da Acção Específica de Valorização da Economia do Mar, do Eixo Prioritário II – Valorização Económica de Recursos Específicos, Convite Público para apresentação de Candidaturas – Mar/TC/PCT/1/2009.", conforme se pode ler nesta página do "Porto de Leixões".
Cerca de 50 milhões de euros então, direitinhos dos nossos bolsos e de outros contribuintes da União Europeia. É discutível se precisamos de investimentos deste tipo para podermos viver melhor, se o betão nos torna mais felizes, se os grandes navios a cruzarem os oceanos nos fazem mais saudáveis... O que me parece menos discutível é que no nosso país de hoje em dia obras deste tipo totalmente financiadas com dinheiro dos contribuintes são verdadeiros estandartes das prioridades políticas assumidas pelo nosso governo.
Num país onde falta dinheiro nos hospitais, nas estradas, nas escolas, nas bibliotecas, nas infraestruturas desportivas, nos tribunais, no apoio aos desempregados, aos pensionistas e a sei lá quantas mais pessoas e sei lá quantas mais coisas, num país onde falta tanta coisa essencial, gastam-se milhões e milhões de euros em terminais de luxo para turistas endinheirados?...
Mas há outro aspecto igualmente chocante neste tipo de opções sobre os gastos do dinheiro que é público: é que sistematicamente financiam-se negócios que têm obrigação de ser rentáveis por sua própria conta! É caso para perguntar: o que é que o nosso governo está a fazer?...
Alguns argumentarão que o porto de Leixões é gerido por uma entidade pública e portanto o dinheiro público aí investido irá gerar receitas que também serão públicas. Isto é acreditar que o porto de Leixões irá gerar superavits nos próximos anos que poderão então ser utilizados na protecção social e outras coisas mais prioritárias. Por outras palavras, é acreditar no pai natal!
Não só isso não vai acontecer, como já se está mesmo a ver que a construção irá ser adjudicada à empresa privada tal e tal, depois aquilo irá ser concessionado por 20 anos à empresa privada tal e coiso, para trabalhar em parceria com dezenas de empresas de turismo e restaurantes e bancos e sabe lá mais o quê privado.
Todos os homens de negócios salivam quando há dinheiros públicos a distribuir para o incentivo a isto ou àquilo...
Trata-se, vim a saber, de um "terminal" para os muitos milhares de passageiros de paquetes que alguém espera vir a receber no futuro.
Noutro dia, já em Lisboa, deu-me para pensar (erros meus, má fortuna...) sobre o custo daquilo e sobre quem estará a financiar a obra. Ocorreu-me, sabe-se lá porquê, que às tantas era eu mesmo que estava a financiar aquilo!... Fui à procura e descobri que sim, que eu, tu, e muitos outros como nós, andamos a financiar a construção da mega-picadora em betão armado.
"Este projecto, da autoria do Arq. Luís Pedro Silva, com um investimento global na ordem dos 49 milhões de euros, foi financiado pelo Programa Operacional Regional do Norte 2007/2013, no âmbito da Acção Específica de Valorização da Economia do Mar, do Eixo Prioritário II – Valorização Económica de Recursos Específicos, Convite Público para apresentação de Candidaturas – Mar/TC/PCT/1/2009.", conforme se pode ler nesta página do "Porto de Leixões".
Cerca de 50 milhões de euros então, direitinhos dos nossos bolsos e de outros contribuintes da União Europeia. É discutível se precisamos de investimentos deste tipo para podermos viver melhor, se o betão nos torna mais felizes, se os grandes navios a cruzarem os oceanos nos fazem mais saudáveis... O que me parece menos discutível é que no nosso país de hoje em dia obras deste tipo totalmente financiadas com dinheiro dos contribuintes são verdadeiros estandartes das prioridades políticas assumidas pelo nosso governo.
Num país onde falta dinheiro nos hospitais, nas estradas, nas escolas, nas bibliotecas, nas infraestruturas desportivas, nos tribunais, no apoio aos desempregados, aos pensionistas e a sei lá quantas mais pessoas e sei lá quantas mais coisas, num país onde falta tanta coisa essencial, gastam-se milhões e milhões de euros em terminais de luxo para turistas endinheirados?...
Mas há outro aspecto igualmente chocante neste tipo de opções sobre os gastos do dinheiro que é público: é que sistematicamente financiam-se negócios que têm obrigação de ser rentáveis por sua própria conta! É caso para perguntar: o que é que o nosso governo está a fazer?...
Alguns argumentarão que o porto de Leixões é gerido por uma entidade pública e portanto o dinheiro público aí investido irá gerar receitas que também serão públicas. Isto é acreditar que o porto de Leixões irá gerar superavits nos próximos anos que poderão então ser utilizados na protecção social e outras coisas mais prioritárias. Por outras palavras, é acreditar no pai natal!
Não só isso não vai acontecer, como já se está mesmo a ver que a construção irá ser adjudicada à empresa privada tal e tal, depois aquilo irá ser concessionado por 20 anos à empresa privada tal e coiso, para trabalhar em parceria com dezenas de empresas de turismo e restaurantes e bancos e sabe lá mais o quê privado.
Todos os homens de negócios salivam quando há dinheiros públicos a distribuir para o incentivo a isto ou àquilo...
Há menos de meia dúzia de dias o governo anunciou (antigamente tinham vergonha, agora publicitam... é a vantagem de ter uma população bem instruída...) que ia gastar 185 milhões de euros em projectos de 12 empresas para a criação de 401 novos postos de trabalho. Mas reparem como a notícia é transmitida: é o governo que põe o dinheiro, mas são as empresas, em letras garrafais, que investem!... Genial!... Limpeza cerebral em acção!...
E porque é que o governo vai gastar 460 mil euros em cada posto de trabalho dessas 12 empresas?... Reparem que se me dessem a mim 460 mil euros para criar o meu posto de trabalho, eu tinha a vida garantida até à reforma!... O governo vai fazer isso porque, coitadinhas das empresas, elas precisam do apoio do Estado, sem o qual nunca conseguiriam criar os benditos "postos de trabalho"...
Se fosse a mercearia da esquina do Sr. Zé, aí não era preciso qualquer apoio, bem pelo contrário, porque toda a gente sabe que a mercearia do Sr. Zé um potentado económico! Mas como é a coitadinha da Portucel, a pobrezinha da Metal Rolo, SGPS, a indigente Zhejiang Huadong Aço Group, da China, a Sodecia, a Borgwarner Emission e outras que tais, é evidente que o apoio dos contribuintes esfaimados é fundamental!
Mas isso é ainda muito pouco. Que dizer da coitadinha da Autoeuropa? Essa precisa de 677 milhões de euros para criar 500 postos de trabalho. Isso dá para pagar 1000 euros por mês a cada trabalhador durante 112 anos!...
terça-feira, 13 de maio de 2014
A obra e a herança sujas do Passos...
Agora que tudo parece correr bem na relação entre Portugal (o que é isso?) e os mercados financeiros (quem são eles?) é caso para perguntar: e o montante da dívida, afinal diminuiu?...
A resposta:
Querem saber quanto é que está previsto pagarmos nos próximos anos para abater esta dívida? Montantes como 15.000.000.000 € por ano são assustadores? Querem saber o que isso significa no quotidiano de cada um de nós?
Então recomendo fortemente a leitura deste artigo.
A resposta:
Querem saber quanto é que está previsto pagarmos nos próximos anos para abater esta dívida? Montantes como 15.000.000.000 € por ano são assustadores? Querem saber o que isso significa no quotidiano de cada um de nós?
Então recomendo fortemente a leitura deste artigo.
Salgalhadas na Lusolândia (4/4)...
Mensagem original
Excerto do capítulo XX de "Salgalhadas na Lusolândia" de José Luís Felix:
Eram 20 horas e iniciavam-se os telejornais. Chegara por fim a hora das declarações do chefe do governo, ansiosamente aguardadas e publicitadas ao longo do dia.
Excerto do capítulo XX de "Salgalhadas na Lusolândia" de José Luís Felix:
Eram 20 horas e iniciavam-se os telejornais. Chegara por fim a hora das declarações do chefe do governo, ansiosamente aguardadas e publicitadas ao longo do dia.
“Lusolandas e lusolandos”, começou ele, solenemente
enquadrado por uma bandeira nacional, uma jarra de rosas amarelas e um galo de
Barcelos. “Os adversários da estabilidade, dos mais sacrossantos valores
pátrios e a gente de todas as oposições não tem descanso.
Levantam calúnias e utilizam o embuste como uma arma de
arremesso. Atrevem-se até a insinuar que o nosso governo não tem exercido uma
acção sem paralelo nos últimos anos em toda a Europa, para conseguirmos
enfileirar entre os melhores actores da acção política na União Europeia.
Os exemplos que podem atestar a nossa actividade são inúmeros,
do choque tecnológico ao Programa Acelerex, das Reformas na Função Pública à
construção de novos estádios de futebol e auto-estradas, a melhoria da
produtividade e a modernização do tecido empresarial lusolando. Todas estas
acções se inserem numa estratégia devidamente definida. Nós não nos deixamos
arrastar pela demagogia, pelo discurso fácil. Podemos assegurar que só com o
esforço de hoje será possível o aumento da riqueza do país e, no futuro, a
melhora das condições de vida de todos nós. Principalmente dos menos
favorecidos pela sorte, sempre presentes nos nossos corações.
Por isso mesmo posso desde já anunciar-vos duas novas
medidas para apoiar os nossos idosos mais desfavorecidos, aqueles que auferem
uma pensão inferior a 200 euros. Assim, daqui a 3 meses, todos eles irão
beneficiar de um aumento extraordinário de 4 euros mensais.
Além disso todos irão também usufruir de uma medida
excepcional da Segurança Social. A cada um será oferecido mensalmente um quilo
de arroz e uma asa de frango. O nosso governo está atento às dificuldades
sentidas pelos mais desfavorecidos dos nossos concidadãos.
Estas dificuldades resultam, é bom realçar, da conjuntura
internacional e do aumento dos preços da energia. Convém recordar que tal
situação foi recentemente agravada com a tentativa de realização maciça de
shows de sexo ao vivo na Arábia Saudita, o que originou graves inquietações
entre os crentes daquele país e o consequente aumento do preço do petróleo.
Também a crise dos mercados financeiros, uma verdadeira hecatombe
diabólica, cujo entendimento só está ao alcance das mentes mais capacitadas da
complexa ciência económica, não nos deixou de lado.
No entanto, a nossa economia é sólida e resistente a todas
as procelas, estejam descansados. Os grandes especuladores, essa gente de maus
instintos, que se aproveitam do idealismo dos governantes, não têm cabimento
nem entrada na nossa Lusolândia. Tranquilizem-se que o governo está
permanentemente atento!
Posso assegurar-vos no entanto que, apesar destes factores
negativos provenientes do estrangeiro, não esquecemos aqueles que mais se
ressentem da crise dos mercados mundiais. As nossas crianças também serão
contempladas com uma medida extraordinária. Cada uma delas terá, já a partir do
próximo ano lectivo, uma cesta de fruta todas as semanas, contendo uma laranja,
uma banana e um cacho de uvas.
Isto revela o empenhamento do meu governo, apesar das graves
dificuldades orçamentais herdadas que, desde a primeira hora, temos combatido.
Passado tão pouco tempo já conseguimos alcançar um défice bem inferior à meta
dos 3% que as normas comunitárias nos impõem, um facto único na história
orçamental da Europa, conseguido em tão pouco tempo. Tudo isto sem esquecer os
mais desfavorecidos, como todas as medidas de carácter social que temos tomado
bem demonstram, reforçadas agora com as decisões anunciadas.
Quanto ao tema da segurança, tantas vezes invocado pelas
oposições da forma mais despudorada, como ainda hoje se viu na Assembleia, num
espectáculo indigno dos mais altos valores democráticos que nos norteiam,
trata-se de uma falsa questão. A Lusolândia é já um dos países mais seguros do
mundo e as medidas que irei anunciar irão consolidar ainda mais a nossa posição
no ranking dos países seguros.
Todas as nossas forças policiais colocadas no terreno irão
receber novos equipamentos, nomeadamente couraças de couro e aço, cassetetes de
grande alcance e armas de raios imobilizantes.
Por outro lado o Governo vai fazer um enorme esforço
financeiro e serão abertos imediatamente concursos para a admissão de 6.000
novos polícias nos diversos serviços policiais nacionais.
A investigação e repressão também conhecerão um novo impulso
com a entrada em vigor do sistema de outsourcing nos serviços policiais. Toda a
actividade administrativa, auxiliar e de guarda das instalações passará a ser
executadas por uma empresa multinacional devidamente credenciada nesta área, a
Brutal Police, que também nos fornecerá o mais moderno know-how e técnicas
avançadas de ataque e investigação da criminalidade. Nesta mesma perspectiva se
insere a construção de 5 novas super-prisões, a serem geridas pela Brutal
Police, que permitirão alojar 10.000 presos e vender as prisões situadas dentro
das maiores cidades do país.
(...)
Foi por esse espírito de missão pelo interesse geral que eu,
assim como todos os membros do meu governo, decidimos abraçar a causa pública.
Para o bem da nossa Pátria, de uma Lusolândia mais feliz, de acordo com os
valores que nos foram transmitidos pelos nossos heróis ao longo da história.
A Pátria não se discute, não permitiremos que os mais
sagrados valores da democracia sejam postos em causa por uma dúzia de
indivíduos que, certamente mal avisados, decidiram colocar em causa a honrada
actividade da política. Não é demais lembrar que, sem acção dos responsáveis
políticos, sem o empenhamento dos partidos políticos, sem os garantes da
democracia, a existência da nossa civilização não seria possível. Se déssemos
ouvidos ao canto de sereia da ignorância, dentro de pouco tempo mergulharíamos
no caos, no salve-se quem puder, no homem lobo do homem. Nunca permitiremos que
se ponha em causa a grandeza dos partidos políticos, os verdadeiros pilares que
garantem uma relação harmoniosa e democrática entre os povos.
Lutaremos com determinação, mas sempre de forma democrática,
para impedir o regresso à barbárie e garantir as regras da civilização
compreendidas e aceites por toda a sociedade.
(...)”
Todo o restante discurso se pautou pela mesma orientação e o
efeito que as palavras do Aristóteles produziram foi esmagador.
Todos aqueles que o ouviram ficaram sensibilizados com a sua
sensatez e clarividência. Estes eram também os atributos que, a par da sua
condição democrática, os mais encartados comentadores da Lusolândia passaram
imediatamente a salientar. O Aristóteles e o seu partido davam a devida
resposta aos opositores e os diversos politólogos não lhe poupavam elogios. O
velho oráculo professor Fatelo, por exemplo, não se detinha nos encómios e
chegou a propor, “Face a esta atitude que revela um enorme sentido das
responsabilidades, é chegado o momento do TYD, o meu partido, entrar em
negociações com o Arquitecto Aristóteles e o PF para estabelecer um pacto de
regime. A pátria tem de estar acima das rivalidades partidárias”. Também o Dr.
Vitelinho ficou extasiado face à intervenção do líder do governo, “O Arquitecto
Aristóteles Acomodado revela mais uma vez uma enorme capacidade democrática e
elevado sentido de estado”. O próprio Mikel Xosa Tavás, um consumado
independente, assegurou, “O Aristóteles marcou pontos com esta intervenção,
reveladora duma capacidade até aqui insuspeitada, própria de um verdadeiro
homem de estado”.
(...)
segunda-feira, 12 de maio de 2014
Salgalhadas na Lusolândia (3/4)...
Mensagem original
Excerto do capítulo XIX de "Salgalhadas na Lusolândia" de José Luís Felix:
Excerto do capítulo XIX de "Salgalhadas na Lusolândia" de José Luís Felix:
(...)
O debate já tinha de facto começado.
No meio de um grande burburinho, discursava na altura o
Francisco Matacães, líder do PWD, que a certa altura vociferou, “Os senhores
traíram os trabalhadores, estão a criar uma situação insustentável entre vastas
massas populares, entre os jovens e os pequenos e médios empresários. Por isso
cresce a insegurança, mas esta insegurança é fruto da vossa insensibilidade. Só
querem farras e abandonam os valores de Abril. A insegurança alastra e vocês
são os responsáveis.
Têm de combater o grande capital e ouvir as aspirações do
povo, que estão consubstanciadas nas propostas do nosso Partido. Mas o
Arquitecto Aristóteles pratica o autismo em relação aos apelos populares, não
lhe interessa a insegurança que grassa entre o nosso povo, não corresponde aos
valores da democracia. Não passa de uma marioneta ao sabor dos interesses do
grande capital monopolista...”. Nesta altura a confusão estalou e ninguém se
entendia.
O Presidente da Assembleia, que se encontrava dormitando
confortavelmente, numa atitude beatífica, devidamente acompanhado por mais de
uma dezena de confrades das várias colorações partidárias, despertou do seu
torpor e, enquanto martelava furiosamente a bancada à sua frente, berrou de
forma descomunal, “Silêncio! Silêncio! Silêncio! Silêncio ou mando evacuar a
sala. Olhem que eu não estou a brincar, senhores deputados”.
O ambiente serenou e, enquanto os distintos representantes
do povo se olhavam assarapantados, o líder do Berloque Sinistro, professor
Piscelim, colocando por uma vez fora de acção a sua característica vozinha que
parecia provinda do além, berrou, o senhor Aristóteles é uma personagem
mefistofélica que persegue os portugueses. O senhor tem de voltar imediatamente
para os confins do inferno de onde fugiu para infernizar a vida dos lusolandos!
Esta intervenção lançou o fogo ao capim e os deputados do PF
desataram a lançar todos os impropérios do seu vasto arsenal em alta gritaria
sobre o chefe do Berloque Sinistro, com a consequente resposta dos seus colegas
do Sinistro. Não tardou muito que todos os deputados opostos ao governo se lançassem
por sua vez numa barragem de artilharia verbal sobre o chefe do PF. Não podiam
de modo algum deixar o protagonismo para o Professor Piscelim, tanto mais que,
como bem lembrara o Dr. Picassinos, as televisões estavam a transmitir
directamente aquele espectáculo para todo o país.
Esta escalada verbal teve a resposta imediata. Os deputados
do PF, convenientemente enquadrados pelo Boneco de Resina, utilizavam os
máximos argumentos para desmantelar os adversários, o menor dos quais, berrado
em coro por todos eles, proclamava, “Grosseiros! Carroceiros! Grosseiros!
Carroceiros!”. O ambiente tornou-se escaldante, todos os deputados berravam e
insultavam e, quando o Presidente da Assembleia pediu algum decoro, ninguém o
quis ouvir. A gritaria ensandecia completamente as meninges dos representantes
do povo e não tardou nada que, contaminados pela febre que se estendia por todo
o salão, os visitantes da Assembleia se juntassem a este fervor.
Do alto dos lugares destinados ao público a delegação de
desempregados e trabalhadores precários ali presente estendeu uma faixa onde se
lia “Queremos viver como gente! Estamos fartos das promessas dos políticos!”,
enquanto gritavam “Nem políticos nem capital! Demagogos! Demagogos!” De
imediato se lhes juntou uma delegação de representantes da polícia, também
sentada naquela tribuna, que, a exemplo dos primeiros, também levantou uma
faixa que dizia, “Sem melhores condições não podemos exercer a autoridade”, e
berravam em coro perfeito numa forma surpreendentemente afinada, “Sem melhor
rendimento a polícia não actua a todo o momento!”, “Sem melhores cacete e
couraça a nossa acção não tem graça!”.
A atmosfera tornou-se irrespirável, todos berravam a plenos
pulmões e ninguém se entendia. O Presidente da Assembleia martelava com força,
mas em vão, até que, também ele de cabeça perdida, assentou o martelo na tábua
à sua frente, com a máxima força que as suas banhas ainda podiam desenvolver.
Através deste expediente arrancou gigantescos sons audíveis a centenas de
metros, uma, duas, três vezes, sem que os antagonistas à sua frente se
comovessem, até que, por fim, um embate ainda mais violento teve um resultado
inesperado. A força bruta das pancadas deixou-lhe ficar apenas o cabo na mão,
enquanto o martelo voava por sobre as cabeças dos membros do governo e
realizando uma surpreendente trajectória foi-se abater sobre a bancada
parlamentar em frente, a do XDS. Aqui rasou perigosamente o capachinho do Dr.
Picassinos e foi repousar no cadeirão da fila de trás. Era o lugar do
Engenheiro Eugénio Bacamarte, que felizmente se encontrava ausente na ocasião.
O prestigiado parlamentar, figura de proa do XDS, presidente da Marcenaria
Democrática, rival da sua homóloga Lusitana, com larga influência nos negócios
Palopianos, encontrava-se no Bar. Dirigira-se para lá havia já mais de uma
hora, onde na companhia de algumas dúzias de colegas das diferentes bancadas e
de umas goladas de whisky velho assistia a um jogo de futebol da selecção
portuguesa. O entusiasmo reinante entre os clientes do Bar só tinha equivalente
na apologia da selecção nacional, prodigalizada nos anúncios das mais
prestigiadas empresas, que não perdiam a ocasião de lembrar à população,
através dos mais diversificados meios de informação, que o bom povo português
não podia deixar de erguer a bandeira nacional para apoiar esta gesta da equipa
nacional de futebol, a “de todos nós”, como relembravam a cada instante.
As maiores empresas a operar no país, como os Hipermercados
Incontinente, a Cerveja Sabes, a Caixa Geral de Repolhos, o Banco do Espírito
Tonto, a TNT, a petroleira Golp e a Koka-Koka, patrocinavam a façanha que
abalava todos os lusolandos.
Com este incidente, o ambiente tornou-se ainda mais pesado.
Por sorte o voo do martelo não atingira o velho engenheiro, devido à sua feliz
ausência, ou por intervenção divina, “devido a mais um milagre da santa”, como
iria assegurar mais tarde o Picassinos, mas as altercações parlamentares
cresciam a cada instante e ameaçavam transformar aquele debate parlamentar numa
pura agonia.
(...)
sexta-feira, 9 de maio de 2014
Salgalhadas na Lusolândia (2/4)...
Mensagem original
Excerto do capítulo XVI de "Salgalhadas na Lusolândia", de José Luís Felix:
Excerto do capítulo XVI de "Salgalhadas na Lusolândia", de José Luís Felix:
(...)
Com esta revelação gerou-se um alvoroço crescente entre os
circunstantes, e com tal rapidez ele crescia, acompanhado, temos de reconhecê-lo,
por um temor difuso, inquietante para todos os presentes, que o Aristóteles se
sentiu na obrigação de acalmar os espíritos da sua gente, “Calma, Calma! Calma
meus amigos e minha amiga!”. Face às suas palavras sucedeu um fenómeno não
inédito mas sempre digno de observar. Aquelas doutas criaturas foram
abandonando o remexer e o cacarejar que as possuía e, aos poucos, deixaram-se
vogar para o paraíso que povoa as mentes e os corações dos poderosos e dos
pobres de espírito.
“Temos um plano bem concebido para fazer abortar todas estas
veleidades e vamos levá-lo à prática. Com êxito garantido, posso-vos assegurar!
Nós temos a coragem indispensável para executar os consertos necessários e
meter essa gente na ordem. Bem podem manifestar-se que não iremos desistir,
prosseguiremos sem nos perturbarmos, insistiremos com valentia, até atingirmos
todos os nossos objectivos. Não daremos um passo atrás, nem mesmo que realizem
uma manifestação com cinco milhões de pessoas. Afinal depois destas
manifestações regressam todos a casa e acaba-se tudo.
Seguem-se, é verdade, as tradicionais negociações com os
chefes da oposição, mas esse é o nosso terreno privilegiado. Não devemos
esquecer-nos disso”.
(...)
“Será anunciada publicamente quanto tivermos a nossa reunião
de governo em mangas de camisa no Allgarve. Iremos lançar uma obra prodigiosa
no domínio dos transportes. O metro do Allgarve, de Vila Real de Santo António
a Sagres, que irá resolver os problemas das estradas congestionadas com que se
deparam os nossos turistas. Esta será a obra do século, o maior metro do mundo,
que muito honrará o nome da Lusolândia”.
A audiência ficou siderada com esta revelação. Boquiabertos
olhavam-se uns aos outros e, mudos de espanto, não proferiam palavra. Assim
permaneceram largos momentos, baloiçando entre a incredulidade e o
divertimento, até que o mais pragmático entre eles, o José Cifrão, Ministro da
Aritmética, inquiriu tonitruante, “Mas, se isto é verdade vai custar somas
inauditas. Como é possível metermo-nos em semelhante empreendimento, ainda para
mais com as finanças públicas depauperadas?”.
Ainda não tinha acabado e já lhe respondia o Aristóteles,
com cara de poucos amigos, que as dúvidas nunca lhe agradavam, “Não há nada
mais sério do que este projecto. Trata-se de uma operação público-privada, na
qual o consórcio que ganhar o concurso ficará concessionário da linha durante
90 anos. Os custos da execução da obra ficarão a cargo das empresas vencedoras
com o apoio do estado”.
“Mas, mesmo assim, onde é que essas companhias vão conseguir
as somas necessárias para encargos tão vultuosos?”, insistiu o Ministro da
Aritmética. “Na banca, naturalmente”, ripostou o outro orgulhoso, “O Governo
dará todas as garantias que a banca precisar e adiantará também as quantias
relativas às receitas previstas durante os primeiros 30 anos de exploração.
Posso ainda adiantar que esperamos que o retorno do investimento seja obtido
após os primeiros 20 anos de exploração e que estes investidores estarão
isentos de encargos fiscais durante os 40 anos iniciais do investimento. Para
assegurar a boa execução de todo o projecto já temos negociações muito
adiantadas com o administrador da grande empresa de obras públicas SOBETÃO, o
nosso bom amigo dr.Jonas Capitone, bem como com o Engenheiro Verdete, Administrador
do Banco dos Crentes.
“Mas assim o Estado é que paga tudo”, atreveu-se o Ministro
da Felicidade.
“Deixemo-nos de demagogias também entre nós. Todos sabemos
que o Estado não tem vocação para gerir um empreendimento desta natureza. O que
se torna importante é encontrar uma empresa de elevado gabarito para um
empreendimento desta dimensão”, fulminou o chefe do governo.
Tudo parecia esclarecido, mas o Ministro da Aritmética não
pensava assim. Possuído pelo seu espírito de contabilista remoía contas e mais
contas no seu íntimo, como o seu olhar abracadabrante denunciava, até que, não
conseguindo mais conter-se, explodiu, “E o défice, o défice o que vai
acontecer-lhe? Sim, porque assim o Estado vai aumentar enormemente as suas
despesas e lá se vão as contas e o tecto dos 3% de défice que a União Europeia
nos impõe. É tudo muito bonito, mas não podemos aguentar despesas desta ordem”.
“Mas podemos reduzir noutras despesas para compensar”,
garantiu o Aristóteles de sorriso aberto. Já está tudo pensado, agora só faltam
os pormenores que de tu próprio irás tratar. Por exemplo, vamos cortar mais com
os funcionários públicos. Nos próximos 5 anos teremos de colocar 100.000 deles
na rua. Nesse período também iremos reduzir enormemente as despesas com os
serviços públicos. Serão abolidas todas as actividades do estado em localidades
com menos de 50.000 habitantes, com excepção dos serviços de segurança, claro
está. Além disso serão extintos todos os serviços públicos situados nas
localidades a mais de 100 quilómetros do mar. Já viram bem o que iremos poupar
com estas medidas?”
Semelhante pergunta obteve uma resposta unânime, a alegria
manifesta que transparecia no rosto de todos. A boa disposição reinava entre os
ministros, com excepção do Ministro da Aritmética que insistiu, “Mas será essa
contenção de despesas suficiente? Convinha também obter alguma receita
extraordinária”.
O chefe de governo não desarmou e adiantou, “Também já
pensámos nisso. Oh Pedro Goulão, tu que participaste em tudo isto, explica lá o
que se prevê sobre esta questão”.
O Ministro da Pátria não hesitou e apressou-se a
corresponder às instruções do seu líder, “Bem, a solução encontrada é muito
simples.
Para obtermos uma arrecadação fiscal considerável teremos de
lançar um novo imposto. Por isso admitimos criar o imposto pedonal. Cada
indivíduo que ande pelas ruas, em deslocações que não estejam ligadas à sua
actividade profissional, terá de pagar um imposto, o imposto pedonal,
proporcional à distância percorrida. Todos os pormenores para levar à prática estas
inovadoras orientações na área fiscal serão naturalmente do pelouro do
Ministério da Aritmética”.
Todos os presentes se mostravam entusiasmados com as
palavras do titular da Pátria e os seus olhares dirigiram-se imediatamente na
direcção do confrade da Aritmética. O José Cifrão sorriu-se e declarou com a
solenidade que o caracterizava, “Caros companheiros é necessário dar os
parabéns ao nosso grande líder. Mais uma vez o Arquitecto Aristóteles
demonstrou a sua soberba imaginação. Desta vez no domínio da fiscalidade, uma
área em que a criatividade se torna cada vez mais necessária e é bem difícil,
eu que o diga. Pois muito bem, o Ministro da Aritmética terá o máximo orgulho
em contribuir para a implementação deste original projecto. Contem comigo, meus
amigos e minha amiga!”.
O ambiente parecia finalmente tranquilo, todos se
felicitavam pelas medidas propostas. Apenas a Ludovina Ranholas colocou mais
uma vez o dedo e o nariz no ar e advertiu, “Mas os colegas já viram que desse
nome, Metropolitano Regional do Allgarve, irá resultar uma sigla horrorosa, que
se pode prestar a todo o tipo de trocadilhos. Sim, porque a sigla será MERDAL,
nem mais nem menos”.
(...)
quinta-feira, 8 de maio de 2014
Salgalhadas na Lusolândia (José Luís Felix)...
O livro do Zé Luís, companheiro que não cheguei a conhecer tão bem como devia, mas de que conheci o amor à emancipação de todos, no sentido mais profundo que a palavra pode ter.
Este livro, "Salgalhadas na Lusolândia", foi publicado, tanto quanto sei, em 2009. Mas poderia ter sido escrito e publicado em qualquer outro ano. Infelizmente as semelhanças entre o que nele é retratado e as realidades de muitos países e em muitas épocas não é coincidência nenhuma. Felizmente o Zé Luís incita-nos à reflexão através do humor... ou será que somos nós que precisamos desse humor como arma de defesa?...
O título do livro predispõe-nos... Os trocadilhos com o Aristóteles Acomodado e os Hipermercados Incontinente acentuam o carácter humorístico... Mas pergunto-me se o título fosse outro e esses trocadilhos não estivessem lá, se chegaríamos sequer a reparar na enorme quantidade de críticas tão profundas quanto subtis que o Zé Luís nos oferece, como oportunidades para olharmos para a nossa realidade com outros olhos.
Um livro que recomendo, sobretudo se for lido com vontade de questionar tudo, incluindo aquilo que consideramos mais estrutural na nossa sociedade e em nós mesmos, mesmo que o estilo nos faça às vezes querer lê-lo de uma só leva.
Irei deixando aqui, neste e noutros três artigos que se seguirão, excertos de alguns capítulos.
Este livro, "Salgalhadas na Lusolândia", foi publicado, tanto quanto sei, em 2009. Mas poderia ter sido escrito e publicado em qualquer outro ano. Infelizmente as semelhanças entre o que nele é retratado e as realidades de muitos países e em muitas épocas não é coincidência nenhuma. Felizmente o Zé Luís incita-nos à reflexão através do humor... ou será que somos nós que precisamos desse humor como arma de defesa?...
O título do livro predispõe-nos... Os trocadilhos com o Aristóteles Acomodado e os Hipermercados Incontinente acentuam o carácter humorístico... Mas pergunto-me se o título fosse outro e esses trocadilhos não estivessem lá, se chegaríamos sequer a reparar na enorme quantidade de críticas tão profundas quanto subtis que o Zé Luís nos oferece, como oportunidades para olharmos para a nossa realidade com outros olhos.
Um livro que recomendo, sobretudo se for lido com vontade de questionar tudo, incluindo aquilo que consideramos mais estrutural na nossa sociedade e em nós mesmos, mesmo que o estilo nos faça às vezes querer lê-lo de uma só leva.
Irei deixando aqui, neste e noutros três artigos que se seguirão, excertos de alguns capítulos.
Capítulo XIII
(...)
O Ministro da Felicidade, sem esconder o incómodo com a
exigência do seu líder, apressou-se a esclarecer a distinta plateia.
O Acelerex era um programa governamental destinado a
aumentar a produtividade do trabalho, numa tentativa de conseguir que os
trabalhadores se dedicassem de forma absoluta às suas tarefas, e permitir deste
modo o acréscimo do volume de produção em todos os domínios.
Os trabalhadores teriam de se adaptar às necessidades da
empresa, trabalhando se necessário 20 horas consecutivas e ficando inactivos
dias inteiros sempre que não fossem necessários os seus préstimos.
A remuneração obtida passaria a ser medida pelas horas de
trabalho efectuadas.
“Vocês sabem como é difícil persuadir os nossos
trabalhadores a entregarem-se de corpo e alma às suas actividades
profissionais, a dedicarem a sua vida exclusivamente à empresa.
As dificuldades encontradas são de tal ordem, com protestos,
absentismo, falta de entrega completa à actividade e até sabotagens, que me vi
forçado a dirigir-me eu próprio ao terreno, com o intuito de persuadir o mundo
do trabalho a identificar-se com os nossos objectivos. O Acelerex destina-se
principalmente a aumentar a rentabilidade empresarial, que assim, através da
obtenção de mais-valias suplementares, poderá, quem sabe, num futuro, vir a
melhorar as condições de remuneração do seu pessoal.
(...)”
O que fazer com tudo isto...
obrigado.
talvez passe.
embora distracções é coisa que
nunca falta, e eu nem sequer tenho tempo para sentar e dedilhar o piano,
quando na verdade preciso é de parar, deitar na cama sem nada para
fazer, nada, nada, nada, nada... olhar para o tecto na esperança de que
não tivesse rachas e fosse um branco ainda mais monótono, para depois,
por osmose, e já sem a pressão da cor em cima de mim, começar a deixar
sair, a tingir, a pintar, poder então olhar para mim e começar a pensar o
que fazer com isto tudo.talvez passe.
quarta-feira, 7 de maio de 2014
O dia da mãe...
Por Elaine Wragg, no dia 3 de Maio de 2014, no Retiro da Fraguinha, entre São Pedro do Sul e Arouca.
terça-feira, 22 de abril de 2014
Vai-te poesia!...
(imagem retirada sem permissão daqui)
Vai-te, Poesia!
Deixa-me ver friamente
a realidade nua
sem ninfas de iludir
ou violinos de lua.
Vai-te, Poesia!
Não transformes o mundo
descarnado e terrível
num céu de esquecer
com mendigos de nuvens
famintos de estrelas
e feridas a cheirarem a cravos
— enquanto os outros, os de carne verdadeira,
uivam em vão
a sua fome de cadelas
e de pão.
Vai-te, Poesia!
Deixa-me ver a vida
exacta e intolerável
neste planeta feito de carne humana a chorar
onde um anjo me arrasta todas as noites para casa pelos cabelos
com bandeiras de lume nos olhos,
para fabricar sonhos
carregados de dinamite de lágrimas.
Vai-te, Poesia!
Não quero cantar.
Quero gritar!
José Gomes Ferreira
terça-feira, 15 de abril de 2014
segunda-feira, 14 de abril de 2014
Porque é que insistes em fazer com que os outros se sintam estúpidos?...
Identifico-me tanto com isto!... E poderia até escrever sobre o assunto... se sentisse que iria ajudar alguma coisa. Infelizmente não acredito que todas as pessoas entendam, sintam e pensem deste modo. Como em tudo, haverá sempre pessoas que se sentirão ofendidas com as coisas que fazemos, mesmo que sejam pelas melhores intenções. É a vida!
quinta-feira, 10 de abril de 2014
sexta-feira, 21 de março de 2014
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
Caminho desactivado...
Caminho neste caminho desactivado…
De cada lado
solo pobre
eucaliptos queimados
mato
e muito lixo.
Postes de betão foleiro e antigo
que nada sustentam…
(Qual será o momento de inércia da sua secção
relativamente ao eixo paralelo ao…
Ai, ai… Que interessa isso?)
Ruído de automóveis por toda a parte
e prédios incompletos e já abandonados
no meu horizonte.
É este o meu pedaço de Portugal.
Tal e qual! Podem vir vê-lo.
Mas isto tem dono!...
Quem foi que fez isto assim?
O meu passo é lasso e o meu olhar lânguido e cansado.
Na mão, no bolso, a chave de casa
que não é minha.
E na cabeça, a fervilhar,
tudo o que me faz único.
A minha cabeça alberga
mais porquês do que todas as respostas que
alguma vez me poderão dar,
desde os momentos de inércia,
aos mais simples,
aqueles que embaraçam toda a gente:
- por que é que se diz não à guerra e se constroem fábricas de armamento?
- por que é que os pais não têm tempo para os filhos?
- por que é que há gente sem emprego?
- por que é que há chocolates “light”?
- por que é que se restringe a imigração?
- por que é que há imigração?
- por que é que ninguém quer saber das minhas perguntas?
Devia haver fábricas de tempo,
liberdade para partir ou ficar
e chocolates “heavy”!
E devia haver espaço para as minhas perguntas
e para as minhas respostas
e para mim.
Devia haver espaço para mim!
Este pedaço aqui ao lado, por exemplo.
Solo pobre, eucaliptos queimados, mato e lixo…
O que se faria disto?...
Far-se-ia o lugar de alguém!
Aquela rocha ali, abandonada,
passaria a estar coberta de memórias,
de risos e esfoladelas de miúdos,
do pelo das calças antigas dos velhotes.
Este pedaço aqui ao lado,
seria um sítio bom para deitar ao sol,
ou para cavar sulcos na terra
e pôr a água a correr por eles,
ou para dormir.
A terra ficaria mais preta,
e os amigos viriam no São João.
(Mas como poderia eu cavar a terra sem sachola?...)
E no entanto é isto!... A quem pertence isto?...
(As pessoas trabalham para poderem ter o que não produzem.
Nós, portugueses, somos especialistas nisso mesmo.)
No regresso encontro enfim os donos
deste pedaço de Portugal.
Os seus automóveis grandes e pesados
e as suas varandas
ostentam símbolos nacionais.
Esses são certamente pedaços de um pequeno Portugal
que eles muito prezam.
Mas, e o outro mesmo ali ao lado?...
Estou cansado.
Aquilo que me faz único,
as minhas ideias e o que sinto,
atiram permanentemente à cara de todos
tudo aquilo que ninguém quer saber.
Torno-me incómodo.
E não sou aceite.
Frustro-me e irrito-me com isso.
E todos os meus porquês se tornam mais agudos
como agulhas que se salientam
quando todo o meu eu se afunda
e me picam a pele por dentro.
E torno-me incómodo.
E inoportuno.
E indelicado.
E agressivo.
E bruto.
E noto, de repente, com imensa surpresa,
que o meu eu é diferente do que eu julgava!
E pergunto-me:
porquê?
…
Caminho sem saber porquê.
E penso:
tenho de ter calma.
Tenho de ser quem quero ser
e não quem sou agora.
Tenho de ser como o velho paciente,
benevolente para com a natureza humana,
benevolente para com este deus
e este mundo
e esta gente.
Tenho de ser… tenho de ser…
Eu sei… eu sei os pormenores de todos os tiros nos pés
que até com algum esforço todos insistem em dar.
Eu sei, porque vi, como as pessoas são más para elas próprias,
como as pessoas não vêem,
como as pessoas não querem ver.
Eu sei o quanto quero mostrar-lhes um outro rumo,
uma outra forma.
Como quero trabalhar ao seu lado para sermos todos mais felizes.
Mas não posso.
Os meus porquês,
como agulhas,
notam-se já na minha pele
e maltratam aqueles a quem a encosto,
aqueles de quem gosto
e a quem quero ajudar.
Não posso mostrar-lhes o que não querem ver.
Não posso discutir o que cá dentro penso.
Não posso afrontar esta realidade que é a deles,
que eles ajudam a construir
e onde se sentem bem.
Tenho de ser diferente.
Caminho com vontade de chegar a casa,
de sentar e escrever,
de mostrar ao mundo que compreendo,
de pedir desculpa aos que magoei.
E agora que o faço
já não sei…
AWF, Valongo, 18 de Junho de 2006
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014
Canta...
(Poema retirado daqui. Obrigado Maria)
Canta
Atreve-te a julgar. Julga os outros julgando-te a ti mesmo.
A natureza das coisas é a tua natureza. Respira-te, despe-te,
faz amor com as tuas convicções, não te limites a sorrir
quando não sabes mais o que dizer. Os teus dentes
estão lavados, as tuas mãos são amáveis, mas falta-te
decisão nos passos e firmeza nos gestos.
Procura-te. Tenta encontrar-te antes que te agarre a
voracidade do tempo.
Faz as coisas com paixão. Uma paixão irrequieta,
que não te dê descanso
e te faça doer a respiração. Aspira o ar, bebe-o com força, é
teu, nem um cêntimo pagarás por ele.
Quanto deves é à vida, o que deves é a ti mesmo. Canta.
Canta a água e a montanha e o pescoço do rio,
e o beijo que deste e o beijo que darás, canta
o trabalho doce da abelha e a paciência com que crescem
as árvores,
canta cada momento que partilhas com amigos, e cada amigo
como um astro que desponta no firmamento breve do teu corpo.
E canta o amor. E canta tudo o que tiveres razão para cantar.
E o que não souberes e o que não entenderes, canta.
Não fujas da alegria. A própria dor ajuda-te a medir
a felicidade. Carrega nos teus ombros os séculos passados e
os séculos vindouros,
muito do pó que sacodes já foi vida,
talvez beleza, orgulho, pedaços de prazer.
A estrela que contemplas talvez já não exista, quem sabe,
o que te ajudou a ser vida de quantas vidas precisou. Canta!
Se sentires medo, canta. Mas se em ti não couber a alegria,
não pares de cantar.
Canta. Canta. Canta. Canta. Canta. Constrói o teu amor,
vive o teu amor,
ama o teu amor. De tudo o que as pessoas querem, o que
mais querem é o amor.
Sem ele, nada nunca foi igual, nada é igual, nada será igual
alguma vez.
Canta. Enquanto esperas, canta.
Canta quando não quiseres esperar.
Canta se não encontrares mais esperança. E canta quando a
esperança te encontrar.
Canta porque te apetece cantar e porque gostas de cantar e
porque sentes que é preciso cantar.
E canta quando já não for preciso. Canta porque és livre.
E canta se te falta a liberdade.
Joaquim Pessoa, in "Vou-me embora de mim"
quarta-feira, 8 de janeiro de 2014
segunda-feira, 6 de janeiro de 2014
Aniversários e musiquinhas larilas...
(mais uma primavera, no Porto...)
O aniversário é um evento anual. Eu não sou assim tão velho, mas acredito que há muitos milhares de anos os homens já festejassem aniversários. Não precisavam de ser muito rigorosos, nem de ter um calendário muito sofisticado. Bastar-lhes-ia, provavelmente, contar luas relativamente aos solstícios. Sobretudo em latitudes onde as diferenças nas estações do ano mais se faziam sentir, toda a vivência se fazia em função do ciclo anual do sol, da vida dos bichos e das plantas, do caudal dos rios, das colheitas. Por isso mesmo ainda hoje se dizem coisas como "comemorar mais uma primavera".
No mundo actual nós fazemos um esforço tremendo para nos esquecermos desse ciclo anual. Temos barragens para controlar o caudal dos rios, estufas para termos laranjas o ano inteiro, aquecedores e arrefecedores e luzes artificiais e tudo o mais. À medida que nos desligamos cada vez mais destes ciclos naturais das coisas, faria sentido supor que os aniversários deixariam de ter tanta importância.
Paradoxalmente, ou nem por isso, os aniversários são comemorados hoje em dia como provavelmente nunca antes aconteceu na história da humanidade. Se não é assim em todas as coisas e em todo o lado, pelo menos no que diz respeito aos aniversários dos nascimentos das pessoas aqui na minha terra é o que me parece.
Uma das coisas que toda a gente costuma fazer hoje em dia é ter um bolo de aniversário que é oferecido ao aniversariante enquanto toda a gente à sua volta lhe canta uma cantiga. Eu perdi poucos minutos e, baseado no que diz na "wikipeida", recolhi alguns exemplos de músicas de aniversário que são cantadas por este mundo fora.
Venezuela
Lituânia
Rússia (a música duma crocodila - é giro ver como se escreve em cirílico - um animal muito comum na Rússia)
Roménia
Ucrânia
Irão
Letónia
México
Entretanto nós aqui em Portugal cantamos uma música pindérica, com uma letra cada vez mais deprimente (repare-se que a quadra "tenha tudo do bom/do que a vida contém/tenha muita saúde/e amigos também", que até tem algum sumo, tem caído muito em desuso), que foi inventada pelos vistos há pouco mais de cem anos... onde?... onde é que tinha de ser?... de onde é que nós vamos sempre desencantar as tradições idiotas como a do pai natal?... nos EUA, claro!
E o que certamente não sabiam é que os direitos de autor da música do "happy birthday to you" são detidos pela Warner, e que esses direitos de autor serão válidos na União Europeia até 2016. Diz no artigo da "wikipeida" que "The company continues to insist that one cannot sing the "Happy Birthday to You" lyrics for profit without paying royalties".
Já era hora, digo eu, de fazermos frente a esta colonização cultural e mantermos as nossas tradições próprias. Não há tradições próprias de músicas de aniversário?... Então inventem-se!
quinta-feira, 2 de janeiro de 2014
Vilarinho da Furna...
Fotos do último passeio (clicar na foto):
Um vídeo sobre a vida na aldeia de Vilarinho da Furna antes da construção da barragem:
Um vídeo sobre a vida na aldeia de Vilarinho da Furna antes da construção da barragem:
Cerveja de gengibre...
Aqui fica uma receita para cerveja de gengibre que vem directamente do livro de receitas da minha mãe.
Ingredientes:
- 28 gramas de ácido tartárico
- 20 gramas de levedura fresca (ou o equivalente em levedura seca)
- 10,2 litros de água
- 1,7 kg de açúcar
- 11 gramas de gengibre em pó
- a levedura deve ser dissolvida de antemão num pouco de água morna. A temperatura óptima para a fermentação é de aproximadamente 35ºC.
- o ácido tartárico serve para baixar o pH da solução. O valor óptimo do pH é de cerca de 5,5. Pode usar-se outro ácido para esse efeito. Uma sugestão é tentar com sumo de limão. Outra possibilidade é procurar água engarrafada cujo pH seja próximo de 5,5 e nesse caso evita-se a necessidade de adição de um ácido.
- a fermentação requer sais minerais. Pode adicionar-se uma a duas colheres de chá de sal à mistura para a facilitar.
- o melhor açúcar para a fermentação é a frutose. Podem utilizar-se combinações de frutose e sacarose. Açúcar branco normal (sacarose) resulta bem.
- o processo de fermentação transforma o açúcar em álcool e dióxido de carbono. Pode parar-se a fermentação antes de estar completa para obter uma bebida mais doce e menos alcoólica. A fermentação deve estar quase completa ao fim de três dias à temperatura de 30ºC. Se a temperatura for menor, a fermentação será mais lenta. Assim, as condições de armazenamento da cerveja influem imenso na sua fermentação.
- o cloro da água canalizada pode dificultar a fermentação. Por outro lado, outras bactérias presentes na água ou nos utensílios ou ingredientes utilizados podem crescer em concorrência com a levedura. Para evitar isso pode ferver-se primeiro a água a utilizar e deixar arrefecer. Se não se deixar arrefecer bem, a elevada temperatura pode matar a levedura.
- a cerveja deve ser engarrafada logo depois de estar preparada. O processo de fermentação prossegue dentro da garrafa fechada. Nesse processo, a libertação de dióxido de carbono aumenta a pressão. Isto implica que a garrafa ficará sujeita a uma elevada pressão, podendo mesmo explodir. É aconselhável utilizar garrafas que originalmente continham bebidas com gás (champanhe, refrigerantes com gás, etc.), pois são mais resistentes. Se se quiser evitar ter de limpar a despensa toda, pode armazenar-se as garrafas de modo a que, em caso de explosão, causem poucos danos. Alternativamente pode abrir-se diariamente a garrafa para diminuir um pouco a pressão, embora isso altere a qualidade final da cerveja.
Bom proveito!
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